Cria do Cine Brasília
De espectador empolgado dos festivais a protagonista de longa-metragem, Vinicius Ferreira segue promissora carreira cinematográfica
Vinicius Ferreira circula entre o mar de poltronas com a destreza de quem viveu bons tempos naquele que é um dos templos do cinema brasileiro. Ele tem intimidade com o Cine Brasília. Para a sessão de fotografias que ilustram este perfil, ele guia o olhar da câmera ora para o palco, ora para a mágica sala de projeção. Pudera. Podemos contar a história desse jovem ator a partir desse local, cravado na quadra 106 Sul. De espectador a protagonista de longa-metragem, ele segue a trajetória com a sétima arte atrelada ao cotidiano. Em nove anos de carreira, acumula 28 produções como ator e prepara-se para estrear como diretor de documentário dedicado às causas indígenas.
O envolvimento com o cinema ocorreu aos poucos. Tinha 12 anos quando soube que os arredores do Cine Brasília se enchiam de paquera à época do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Nem sabia do que se tratava. Em noites de disputa pelo troféu Candango, rumava para lá na expectativa de trocar olhares e beijos com as meninas. “Ia escondido dos meus pais. Saía lá da 108 Norte e era uma festa, um point de namoro. Só depois, entendi o que acontecia dentro da sala de cinema.”
Não demorou muito e o rapazote que azarava as garotas transformou-se em empolgado espectador, daqueles cheios de opinião. Vinicius foi descobrindo o encantamento em estar num festival, cuja plateia não é só um adereço. Estava lá na histórica sessão de Bicho de Sete Cabeças, de Laís Bodanzky, em 2000. Sentado numa das poltronas, fez coro para a vaia histórica lançada ao ator de novelas Rodrigo Santoro. Depois da exibição do filme, pasmo como a maioria, puxou as palmas que redimiram o público diante do desempenho vigoroso do ator. “Não tive vergonha. Fiquei de pé e saudei merecidamente aquele ator.”
O teatro abria as portas e, de repente, Vinicius voava como se estivesse sobre um tapete mágico, encantando as crianças no papel de Aladim. “As coisas aconteceram em velocidade. Fui parar no set de filmagem a partir de uma conversa despretensiosa que tive com o diretor Gustavo Galvão, no bar Beirute. Fui acompanhar uma namorada, também atriz, para uma entrevista e acabei convidado para fazer o curta-metragem.”
O filme Danae permitiu que Vinicius experimentasse viver o outro lado do Cine Brasília. O curta foi exibido na programação do 37º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. A sensação de olhar para aquele público cheio de expectativas ainda está na memória. “As pernas tremiam. Era a primeira vez que eu ia me ver na tela grande”.
Enquanto sua imagem circula pelas telas, Vinicius pisa no set em sua primeira empreitada como codiretor no documentário Índio Cidadão, que comanda ao lado do irmão Rodrigo Siqueira. Na ponte aérea São Paulo/Brasília, negocia a venda de duas séries sobre futebol para canais fechados e trabalha para a criação do primeiro longa de ficção, que vai dirigir, talvez atuar. “As emissoras e a grana estão em São Paulo. Por isso, trago os projetos para negociar por aqui. Além de desafiador colocar seu projeto na tevê, acredito que ao longo do tempo o mercado verá Brasília como um oásis, pela qualidade de nossos produtos e nossos profissionais”, projeta.
No ano passado, ele rodou mais dois longas-metragens brasilienses: Até que a Casa Caia, de Mauro Giuntini, ao lado dos atores Marat Descartes e Virgínia Kavendish; e O último Cine Drive-in, de Iberê Carvalho, com Othon Bastos, Rita Assemany e Zécarlos Machado.
O TAPETE DE ALADIM
Viver Aladim no teatro foi uma experiência inesquecível para Vinicius Ferreira. Ele estava à época estudando na Faculdade Dulcina de Moraes e, impaciente com o ritmo acadêmico e as teorias obrigatórias, abriu o classificados do Correio Braziliense e viu uma seleção de elenco para o novo infantil da Cia. Neia & Nando. Correu para lá e teve uma vivência marcante, aprendendo a lidar com todas as etapas de uma produção. “Ali, aprendi os princípios do fazer teatral.”
No palco, ele se empolgava com a personagem e, muitas vezes, saltava pelas poltronas, deixando as crianças em êxtase e os produtores, de cabelo em pé. O teatro está presente em sua lida até hoje. Recentemente, viveu a travesti Frutinha nos palcos. Já foi Cássia Eller. É também iluminador de montagens profissionais e sonha em produzir espetáculos.