Luxo sustentável
Artesãos e artistas de Brasília descobriram o cerrado como rica matéria-prima. Respeitando o meio ambiente, conseguem produzir peças que atraem a atenção de países estrangeiros
Hoje, a empresa trabalha com mais de 20 espécies de plantas. Entre setembro, depois do período de queimadas, e o fim de fevereiro, a matéria-prima é recolhida e passa por um processo de esqueletização. “A gente trabalha dentro de um sistema ecologicamente correto. Queremos que o cerrado seja sustentável, não só que gere renda com os seus recursos. Toda nossa produção é feita de forma consciente, em que tudo é aproveitado.” Roze costuma dizer que é uma invasora do cerrado. Por isso, se lá tem uma folha comida, rasgada ou seca no chão, ela recolhe para suas peças. Mas nunca agride uma árvore para isso.
O tingimento das folhas para a confecção das peças ocorre de duas formas. Uma delas é muito semelhante à usada em roupas, mas bem menos agressiva. A outra, “vinda da época da vovó”, é natural. O alvejamento das folhas é feito por troca de água e a coloração é conseguida usando urucum, açafrão, casca de caju, entre outros. Esse processo, mais natural, demora e é mais dispendioso, mas um único cliente, na França, absorve toda a produção.
Como Roze, um empreendedor sustentável é aquele que pensa nos clientes e nas pessoas que trabalham com ele, em sua qualidade de vida. Pensa também no lucro, é claro, mas sem que, para obtê-lo, agrida o meio ambiente. São pessoas que inserem a sustentabilidade nas suas práticas, desde a produção até o produto final. Flávia Barros, gerente da Unidade de Acesso a Inovação e Tecnologia do Sebrae-DF, explica que, ao contrário da crença popular, a inserção desse pensamento dentro do processo produtivo nem sempre encarece o produto final. “Quando ensinamos a otimização de recursos, a não desperdiçar insumos, aumentamos a margem de lucro porque diminuímos os custos da produção.”
Luiz Galvão começou a exportar seus produtos no final da década de 1990. “Mas nunca abati uma árvore para realizar o meu trabalho”, conta. O artista acredita que a saída de sua produção para o exterior iniciou por meio do corpo diplomático sediado em Brasília. Logo depois, começou a participar de eventos internacionais. Nascido em Porto Alegre, mas morador de Brasília há 35 anos, Luiz trabalha com madeira para desenvolver diversos produtos, de banquetas a painéis e esferas decorativas.
“Não vendo peça isolada. Vendo container e isso é permanente. Não é uma coisa assim, que vende uma peça hoje e outra só daqui a três meses.” Os Estados Unidos são o país que mais compra sua obra, seguido de Itália e França, todos mediados por uma exportadora. Alguns fornecimentos são compras anuais. Nessa modalidade, vende para vários outros países, como Espanha e Noruega. No máximo, 3% de sua produção ficam no mercado interno. O que é comercializado no Brasil fica por conta da relação direta do cliente com Luiz. “As coisas vão se desdobrando, não é algo que foi planejado. Os resultados é que nos fizeram chegar a esse padrão internacional.”
O artista trabalha com cerca de 150 pessoas entre marceneiros fixos treinados por Luiz, alguns outros terceirizados, além de famílias indígenas e ribeirinhas. Todos recebem o pagamento de acordo com o mercado internacional.
Com o auxílio do Sebrae-DF, houve um fortalecimento do grupo, que passou a ter apoio especializado e cursos. Hoje, estão sempre em feiras na cidade, em São Paulo e em Minas, além de terem clientes cativas no exterior, algumas na França e na Itália. Uma das fundadoras do grupo, Dirce Maria da Silva, conta que essas consumidoras conhecem o trabalho por meio de parentes ou amigos no Brasil e passam a fazer encomendas. “Se a pessoa gosta do meu trabalho, faço de tudo para que ela receba”, conta.