Para ler, viver e conviver
As bibliotecas do Distrito Federal oferecem espaço para acesso à literatura, estudo e convivência, mas carecem de atenção e recursos
O novo conceito de bibliotecas pretende apagar a imagem de um centro empoeirado e silencioso para o descanso de livros. Se atualmente o sistema de bibliotecas de Brasília tem grande público entre os concursandos e vestibulandos da capital, a ideia é ampliar o uso desses espaços para construir maior senso de comunidade na população. A partir de projetos de promoção cultural, do uso de novas tecnologias e da contribuição de usuários, muito tem sido feito para diminuir a distância entre a população e as bibliotecas. Aumento do repasse de recursos e maior atenção por parte de governo e da sociedade, no entanto, ainda são necessários para tornar esses locais centros de excelência em cultura, literatura e convivência.
A estudante de Economia Ingrid Matos, de 19 anos, não é a típica usuária de bibliotecas. O mais comum são aqueles que não fazem uso do acervo, mas apenas do espaço para estudos. Frequentadora da Biblioteca Pública de Brasília, localizada na quadra 512/513 Sul, Ingrid não só estuda no local, mas pega emprestados livros didáticos e de literatura desde a infância. “Minha mãe sugeriu que eu procurasse na biblioteca pública livros que não achava na escola”, conta. Fã de Lima Barreto e Martha Medeiros, entre muitos outros, principalmente modernistas, ela mantém uma rotina de visitas de pelo menos duas vezes por semana para pegar ou devolver os livros. Ingrid nunca foi tão assídua, no entanto, quanto durante o tempo em que estudava para o vestibular. Na época, ficava horas diariamente em alguma das mesas de estudo.
Assim como Ingrid, a maior parte de quem frequenta as bibliotecas busca um espaço confortável e calmo, que facilite a concentração para os estudos. Ficar em casa não parece opção viável para muitos, que preferem evitar as distrações dos afazeres e lazeres domésticos. Mas, diferentemente dela, os concursandos e vestibulandos não voltam às bibliotecas depois que atingem seu objetivo. “Entendemos que as bibliotecas públicas vão além de um espaço de estudo e de leitura. Mais do que isso, a concepção moderna orienta que ela deve ser um espaço de encontro, de informação, de cultura, de lazer”, conceitua o diretor do Sistema de Bibliotecas Públicas da Secretaria de Cultura do GDF, Wander Martins Borges Filho. Segundo ele, estudos apontam o aumento do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) nas regiões em que as bibliotecas são resguardadas.
Mesmo bibliotecas de centros acadêmicos, como a da Universidade de Brasília, necessitam hoje de incremento em pessoal e estrutura. Confrontados com a realidade de escassez de financiamento para melhorias, muitos funcionários e usuários fazem o possível para manter os espaços íntegros e confortáveis. A responsável pela Biblioteca Pública de Taguatinga, Jacyara Cavalcante de Paula, ressalta o esforço de servidores e voluntários em manter o padrão de qualidade do local. Os cuidados vão desde o asseio do ambiente à promoção do uso de livros como moeda de troca.
O diálogo com os usuários é fundamental. Foi por conta desse espírito que os usuários se juntaram para adquirir um forno de micro-ondas de uso compartilhado e, com doações, conseguiram construir a estante para concursandos, com apostilas e livros teóricos. Entre as estantes temáticas da biblioteca, há destaque também para os escritores de Brasília e Taguatinga, uma especial para o público infantil e outra para as novas aquisições. Há ainda o novo projeto Livro livre, que consiste na distribuição de estantes itinerantes colocadas em parques e praças com volumes de acesso livre para a comunidade. “A biblioteca é protegida pelo carinho de ser memória viva da comunidade da região”, explica Jacyara.
O esforço de transformar a biblioteca em ator de promoção da cidadania também pauta o trabalho da Biblioteca Nacional de Brasília. Inaugurado em 2008, o espaço tem salas para atividades infantis, corredor da língua portuguesa e o espaço clique, que oferece uso livre de computadores para a comunidade. A criação de um cineclube e a promoção de palestras de temas diversos foram outras medidas simples para aproximar a biblioteca do público. O acervo foi recentemente liberado para empréstimo. Hoje qualquer cidadão, que apresenta um documento de identidade pode se cadastrar e pegar emprestado um livro dentre os cerca de 20 mil volumes da instituição. Segundo o diretor da Biblioteca Nacional de Brasília, Yuri Guimarães Barquette, a importância de liberar as obras para empréstimo é inestimável e o índice de perda ou danificação é mínimo. Com a catalogação e liberação do acervo, os planos agora são fortalecer os eventos e a cultura de uso do espaço de maneira plural. “Precisamos mudar a mentalidade de que biblioteca é lugar sem vida, lugar de por estudantes de castigo. Nosso intuito é criar uma maior sensação de pertencimento”, conclui Barquette.
Ser a memória de fatos, eventos, pessoas e locais é um dos objetivos principais de qualquer biblioteca. E é em especial uma das duas maiores funções da centenária Biblioteca do Senado Federal Acadêmico Luiz Viana Filho. Criada 12 dias após a fundação do próprio Senado, em 18 de maio de 1826, os seus maiores propósitos são a documentação da história do país, em especial dos acontecimentos políticos do Brasil, e o fornecimento de informações confiáveis e atuais a senadores e assessores. “A Biblioteca do Senado vem adquirindo ao longo de sua história acervo muito rico. Parlamentares e pesquisadores vêm buscar informações sobre tudo o que é discutido em sociedade, e que acaba sendo discutido no parlamento”, diz a diretora da Biblioteca, Helena Celeste Vieira.
Em 187 anos de existência, a Biblioteca do Senado acumulou cerca de 190 mil volumes de livros, mais de 200 mil fascículos de periódicos, 75 mil exemplares de jornais e uma coleção com 3 milhões de recortes de 12 jornais de circulação nacional organizados por assunto. Por conta do foco no material histórico, pesquisadores nacionais e internacionais estão entre os principais usuários do acervo. Em prol da cultura do acesso, a biblioteca é aberta ao público, que pode consultar no local todo o acervo, bem como usar o espaço para estudos. “Bibliotecas têm sempre função social, de informar e educar a sociedade, além de promover a inclusão cultural e digital”, define Helena.
A tecnologia proporcionada nas últimas décadas à ciência da Informação transformou a realidade da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (UnB). A troca de textos e obras em rede possibilita uma revolução no acesso à informação científica. Por meio do portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a que a UnB está integrada, é possível encontrar mais de 50 milhões de volumes de inúmeras instituições no mundo, acessíveis a qualquer visitante da biblioteca. E a visibilidade do conhecimento produzido na UnB também se amplifica. “O Brasil é a 13ª potência em produção científica. O problema está na visibilidade desse trabalho”, ressalta o diretor da Biblioteca Central da UnB, José Emir Suaiden.
Criada em 1962, a biblioteca da UnB viveu tempos de dificuldades. Entre elas, destacam-se a falta de sede própria até 1973 e as opressões da época da ditadura, que proibia títulos e controlava o trabalho de funcionários. Hoje, falta de segurança, número de servidores aquém do necessário e falta de espaço para visitantes estão entre os principais desafios. Com espaço amplo de um projeto desenvolvido especificamente para abrigar a biblioteca, no entanto, o local continua sendo um dos preferidos por estudantes de todo o Distrito Federal. São cerca de 5 mil visitantes diariamente. Muitos permanecem por muitas horas na biblioteca, aproveitando um dos mais amplos horários de funcionamento das instituições dessa natureza em Brasília (veja quadro). O intuito era, como em anos anteriores, manter a biblioteca aberta 24 horas. A falta de pessoal e segurança, no entanto, são os principais impedimentos, segundo Suaiden.
Os frequentadores da Biblioteca Demonstrativa de Brasília também pedem melhoras na estrutura do local. Em sua maioria estudantes para provas de concurso, eles têm dificuldades por conta de problemas, como ar-condicionado quebrado, mesas e cadeiras antigas e desconfortáveis e iluminação ruim. A interação com outros usuários e funcionários, no entanto, estão entre as vantagens do local, mesmo para quem usa a biblioteca com o intuito de se dedicar a solitária tarefa de estudar. A estudante de Direito Misa Pereira de Abreu frequenta o local há um ano. Conheceu a biblioteca por meio de um amigo e conheceu novos durante as tardes e noites de estudos diários. “Ver muita gente estudando é um incentivo. Conversamos sobre concursos, trocamos informações e fazemos amizade. Até porque a gente passa muito tempo junto”, conta a estudante. A relação com os funcionários também é próxima. “A intenção de quem trabalha hoje em bibliotecas é integrar os mais diversos tipos de público neste espaço, torná-lo um lugar de todos”, explica Wander Martins.
Saiba Mais
Biblioteca Central da UnB
Acervo: 1,5 milhão de volumes
Empréstimo: apenas para alunos, professores, servidores e ex-alunos cadastrados
Localização: Campus Universitário Darcy Ribeiro, Gleba A
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, das 7h às 23h45, e aos sábados, domingos
e feriados, das 8h às 17h45
Estacionamento: há, mas com poucas vagas
Restaurante: há uma lanchonete
Ar-condicionado: não há, mas o espaço do prédio beneficia a ventilação natural
Número de visitantes: 5 mil por dia
Acesso à internet: por wi-fi e computadores
Biblioteca Nacional de Brasília
Acervo: cerca de 20 mil
Empréstimo: após cadastro disponível por meio de apresentação de documento de identidade
Localização: Setor Cultural Sul, lote 2
Horário de funcionamento: De segunda a sexta, das 8h às 18h
Estacionamento: há
Restaurante: não há
Ar-condicionado: quebrado e sem previsão de conserto em 15 de fevereiro
Número de visitantes: cerca de 800 por dia
Acesso à internet: por wi-fi e computadores
Biblioteca Demonstrativa de Brasília
Acervo: cerca de 120 mil volumes
Empréstimo: permitido após inscrição, feita por meio da apresentação e documento de identidade com foto, comprovante de residência, contribuição voluntária de taxa de inscrição
Localização: 506/507 Sul
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, das 7h30 às 13h
Estacionamento: há. São menos de dez vagas no prédio, além do estacionamento público da entrequadra
Restaurante: não há
Ar-condicionado: até 15 de fevereiro, o equipamento estava quebrado e sem previsão de conserto
Número de visitantes: 500 por dia
Acesso à internet: por meio de computadores
Biblioteca Pública de Taguatinga Machado de Assis
Acervo: cerca de 35 mil volumes
Empréstimo: após cadastro feito com apresentação de documento de identidade e doação de livro
Localização: CNB 01 Área especial, Taguatinga
Horário de funcionamento: de segunda a sexta, das 8h às 22h, e sábado das 9h às 17h
Estacionamento: há estacionamento público, com poucas vagas
Restaurante: não há
Ar-condicionado: não há, mas o espaço facilita a ventilação natural
Número de visitantes: cerca de 200 por dia
Biblioteca do Senado Federal Acadêmico Luiz Viana Filho
Acervo: cerca de 450 mil volumes, além de coleção de três milhões de recortes de jornais
Empréstimo: apenas para servidores e parlamentares
Localização: Senado Federal, Anexo II, Térreo, Via Norte 2 (N2)
Horário de funcionamento: de segunda a sexta-feira (exceto feriados). Para servidores e parlamentares, o horário é das 8h30 às 18h30. Para o público externo, das 9h às 14h
Estacionamento: há o de visitantes do Senado. Poucas vagas.
Restaurante: não há
Ar-condicionado: há
Número de visitantes: não informado
Acesso à internet: por wi-fi e computadores
Biblioteca Pública de Brasília da 512/513 Sul – Acervo literatura e construção da comunidade
Acervo: 60 mil volumes
Empréstimo: mediante cadastro, feito após a apresentação e documento de identidade
Localização: 512/513 Sul
Horário de funcionamento: de segunda a sexta das 7h30 às 18h e sábado das 9h às 17h
Estacionamento: há o estacionamento público da entrequadra
Restaurante: não há
Ar-condicionado: não há
Número de visitantes: cerca de 100 por dia
Acesso à internet: por meio de computadores