Delícia itinerante
Os food trucks já estão bastante populares em Brasília. Cinco empreendedores falam sobre o sucesso e os desafios do negócio
Após deixar o último emprego, o empresário Miguel Lopes passou meses estudando o mercado e montando um plano de negócios de comida itinerante. “Trabalhamos por aproximadamente mais três meses na montagem do veículo”, conta o proprietário do Burger Truck, que divulga os locais e horários de parada no www.burgertruck.com.br e nas redes sociais. A receptividade ao negócio tem sido ótima, segundo ele. “Brasília é uma cidade extremamente propícia aos food trucks, com amplos espaços. Além disso, tem poucas opções de alimentação de qualidade sem a burocracia de um restaurante, o que inclui sentar, olhar o cardápio, chamar o garçom, pedir, esperar, aguardar a conta, etc.”, comenta. Em dias mais “fracos”, o Burger Truck atende cerca de 50 clientes. Em eventos, esse número ultrapassa as centenas.
Com experiência de mercado, após ter sido sócio, chef e consultor, montando restaurantes e empresas de gastronomia, Bruno Cajado acumulou por dois anos o desejo de montar um food truck. “Pelo conceito de liberdade, de levar a boa e alta gastronomia para a rua, com valores acessíveis, e com essa grande vantagem de trabalhar com custos reduzidos”, lista algumas das razões para a decisão. Rodando desde o início de setembro com o Bistruck, negócio que propõe levar comida brasileira de qualidade a diferentes pontos da cidade, o empresário acredita que o investimento de cerca de R$ 240 mil não só valeu a pena, como só deve ganhar impulso na cidade.
Com uma estrutura similar a qualquer cozinha industrial de alta escala, o truck que hoje circula com itens como bobó de camarão, farofa de dendê e risoto vegetariano no menu foi, inclusive, trazido da capital paulista para ser “reconstruído” aqui. Com um terço do tempo e metade do valor que teria pago em São Paulo, Cajado planejou e mandou executar todo o Bistruck tendo quatro fornecedores diferentes na cidade. “Hoje eu tenho um sistema de cozinha fixa replicado dentro do caminhão: chairbroiler (para grelhados), fogão industrial de quatro bocas, cozedeira de massas, banho-maria, pista fria, coifa industrial, forno combinado, refrigeradores e congeladores, reservatório de água de 300 litros em cima do caminhão, reservatório de dejetos”, lista.
Feliz com o movimento desse novo tipo de negócio na cidade, o empresário lamenta apenas a ausência de uma legislação que permita seu funcionamento efetivo nos eixos brasilienses. “A maioria dos food trucks de Brasília já está com a documentação regularizada junta ao Detran e à Anvisa, mas não tem licença de operação, como ambulante, porque não existe legislação”, diz (entenda melhor a situação de insegurança na página ao lado).
De duas a três vezes por semana, o Corujinha Foodtruck sai às ruas em horários de almoço (11h às 14h) ou no happy hour (18h às 22h). A proposta de Marcela Prado Junqueira surge como ousada e inovadora. “Nosso cardápio é centrado em alimentos orgânicos, lanches gourmet e saladas. Tudo preparado com ingredientes frescos, selecionados e de produtores locais”, conta. Quem topar com o empreendimento por aí, vai encontrar três opções de hambúrgueres artesanais que têm cativado o paladar do brasiliense. “O nosso xodó é o Mumu Burger, feito de hambúrguer de carne, cebolas caramelizadas e cheddar no pão integral”, conta Marcela.
Resultado de um grupo de colegas, clientes assíduos de comida de rua e comunicadores de uma agência de sites e marketing, o Guia Food Truck nas Ruas nasceu para ser uma plataforma virtual de onde encontrar representantes da proposta. “Por que não fazer um aplicativo e um site para que o público consiga buscar os food trucks que existem e saber onde eles estão, o que servem?”, questiona a paulistana Carla Somose, para descrever a ideia. Uma das idealizadoras do projeto, ela lembra, porém, que todo o movimento é ainda muito recente no país e que por isso são poucas as regiões que já têm mapeamento e uma quantidade grande de trucks cadastrados (até agora, São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná e Distrito Federal possuem suas versões). Ainda assim, o formato só cresce. “É um mercado que está em crescimento. Muitos trucks já estão em expansão para duas, três unidades, para atender a demanda de eventos”, conta ao acompanhar a cena nacional.
Para fazer parte do guia, é preciso preencher um formulário no site www.foodtrucknasruas.com.br e pagar uma mensalidade de R$ 80 que dá direito à página no site e no aplicativo, divulgação nas redes sociais, além da atualização semanal da agenda. Para o empresário Marcelo Barbosa, responsável pelas massas e pizzas servidas no Supreme Macaroni e cadastrado no guia, a interação da classe recém-surgida também merece destaque. “O pessoal está unido, fazendo a coisa acontecer e firme na ideia de proporcionar e popularizar uma comida de qualidade”, afirma.
Eduardo Golin e Marcel Castello Branco prestigiaram vários eventos voltados ao setor de cervejas artesanais Brasil afora, até que, no início de 2013, conheceram a kombipa, da cervejaria Bodebrown, em Curitiba, e voltaram para Brasília com o intuito de efetivar uma proposta similar. “A opção pelo estilo Beer Truck foi natural, em função da necessidade de operar com mobilidade, sem ponto fixo. A ideia original era transformar a Kombi em uma ‘vaca’ e extrair as cervejas diretamente das ‘tetas’ dela para o copo do cliente”, explica Eduardo Golin, “coordenhador” da empresa Corina Cervejas Artesanais.
Depois de ter sido dono do restaurante Carpe Diem por 20 anos, Jael da Silva já tem todo o plano traçado para colocar nas ruas um truck de sanduíches gourmets, incluindo uma versão vegana. Membro da diretoria do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (Sindhobar), o empresário quer trazer para Brasília o modelo bem-sucedido de empreendimentos itinerantes que viu em uma feira especializada do ramo em Chicago (EUA). Uma das razões que embasam a decisão do investimento, segundo ele, é o baixo custo em relação a um estabelecimento tradicional. “E a ideia também que se ofereça um preço menor do que se encontra por aí. Sai 30% mais barato, por um produto tão bom ou melhor do que por aí”, diz.
A decisão de pôr em prática – e circulando – o truck, que já tem máquina própria de sous-vide (processo de embalagem a vácuo, para ser cozido, preservando as características do ingrediente) e pretende assar na hora seus pães artesanais, esbarra, entretanto, no respaldo legal. Silva afirma que só dará a primeira volta com o restaurante móvel quando o projeto de lei, que vai normatizar todas as características físicas e regras de funcionamento para esses veículos, for aprovado pela Câmara Legislativa do DF. Para tanto, o empresário conta com o apoio de fortes representantes na casa. Apesar de não ser uma unanimidade, já que “tudo quando é novidade, no começo, tem certa rejeição”, Silva afirma que é interesse, tanto do Sindhobar quanto da Abrasel-DF (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), que haja uma legislação apoiando o ramo. “Até porque isso já é quase que uma moda mundial. A cidade vai adotar isso. É irreversível”, aposta.