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Faça o bem, olhe a quem

É comum praticar atos de solidariedade sem necessariamente conhecer a pessoa beneficiada. Mas esse encontro pode proporcionar momentos gratificantes

Leilane Menezes - Colunista Publicação:24/12/2014 13:45Atualização:24/12/2014 13:48

Lucineide Rodrigues de Oliveira conheceu pessoalmente Rakelly Marques, que receberá seu presente de Natal: emoção no abraço (Bruno Pimentel/Encontro/D.A. Press)
Lucineide Rodrigues de Oliveira conheceu
pessoalmente Rakelly Marques, que receberá
seu presente de Natal: emoção no abraço
Você pode emprestar seus olhos a quem não consegue enxergar e assim passar a ver mais longe. Também é possível doar autoestima, ao fazer uma peruca para quem perdeu os cabelos por conta do câncer. Adotar o desejo de Natal de uma criança é dar esperança a quem anda desacostumado a ser atendido quando sonha. Ao escolher fazer o bem, quem doa transforma-se em um fazedor de sorrisos. Muitas vezes, não é necessária riqueza material, mas uma dose de boa vontade. Nas linhas a seguir, conheça exemplos de quem doou e se descobriu o maior beneficiado com a atitude solidária.


Morador do Recanto das Emas, Paulo Lafaiete de Lima, de 29 anos, foi o único entre três filhos de um casal de vigilantes a concluir a faculdade. Também é o único entre os irmãos que não enxerga. “Aproveitei as oportunidades, apesar de para mim ter sido mais difícil. Eles (os irmãos) não se interessaram”, diz Paulo. Formado em comunicação social, ele frequenta também aulas complementares de escrita cursiva, no Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais. Usa os audiolivros e as transcrições em braile da biblioteca do colégio para estudar para concursos. Alguns gêneros literários, como a poesia, têm menos oferta em linguagem adaptada.


O estudante acessa o site do projeto Purpurinar, idealizado pela escritora Adriana Ribeiro, onde encontra poesias e crônicas transformadas em áudio por voluntários. Sem sair de casa, homens e mulheres fazem leituras e abastecem a página da internet, sem ter ideia de quem ouvirá. “É muito interessante e abre opções de estilos literários. Ficamos muito presos em texto narrativo. Alguns voluntários entram no texto, leem com muito gosto”, relata Paulo.


Uma das vozes do Purpurinar pertence ao funcionário público José Clovis, morador do Sudoeste. Clovis conheceu na internet o projeto e quis doar-se de alguma maneira. Não imaginava que o poema gravado por ele seria ouvido e apreciado por Paulo Lafaiete. Os dois se conheceram em novembro, a convite de Encontro Brasília. Descobriram interesses em comum. “Depois que me aposentei, fui procurar projetos sociais para colaborar. O Purpurinar é maravilhoso, especialmente para quem não tem muito tempo ou não deseja assumir compromissos fixos presenciais”, explica Clóvis.


Fazia tempo que Estênio Campelo não ia à Pousada dos Idosos, na Casa do Ceará, que recebe suas doações: viu os benefícios co-lhidos por pessoas como Rubinita (Raimundo Sampaio/Encontro/D.A. Press)
Fazia tempo que Estênio Campelo não ia à
Pousada dos Idosos, na Casa do Ceará, que
recebe suas doações: viu os benefícios co-
lhidos por pessoas como Rubinita
A filosofia de vida praticada por ele prega que não há felicidade maior do que ver o outro feliz. “Quem experimenta essa sensação sabe do que estou falando. Todos saem beneficiados.” Ele faz ainda apresentações musicais voluntárias em asilos.


Existem várias maneiras de ajudar. Há um ano, a arte-educadora Tânia Alves Pinto, moradora de Taguatinga, descobriu a dela. A confecção de perucas para mulheres que perderam os cabelos devido ao tratamento contra o câncer ocupa a maior parte do tempo de Tânia e da mãe dela, Ilda Barbosa. A primeira costura os fios no forro da peruca. A segunda lava e penteia os cabelos doados. “No começo, não era um programa, fazíamos poucas perucas. Hoje, está com a força toda, graças às doações de cabelos. Aprendi a fazer as perucas porque me sinto muito bem em poder ajudar”, explica.


Quem recebe as perucas feitas por Tânia e Ilda sente-se melhor ainda. Quando Maria Tereza dos Santos, moradora de Águas Lindas de Goiás, casou-se, sua autoestima estava abalada. Careca e com o corpo inchado por conta da quimioterapia, ela tinha dificuldades em se enxergar bonita vestida de noiva. “Eu não queria desistir do casamento, mas também não queria casar careca. Estava deprimida, me sentindo frágil. Quando recebi a peruca, meu  humor mudou totalmente. Levantou o meu astral. Eu vivi de novo”, diz Maria Tereza.

 

José Clovis grava textos para ajudar deficientes visuais, como Paulo Lafaiete: no primeiro encontro entre os dois, descobriram interesses em comum, como a literatura (Vinícius Santa Rosa/Encontro/D.A. Press)
José Clovis grava textos para ajudar deficientes visuais, como Paulo Lafaiete: no primeiro encontro entre os dois, descobriram interesses em comum, como a literatura
Recentemente, ela perdeu os cabelos mais uma vez, voltou a lutar contra o câncer. E recebeu uma nova peruca. “Elas são meus anjos, mas, para me ajudar, precisam das doações. Peço que as pessoas doem seus cabelos, porque faz toda a diferença na vida de alguém”, afirma Maria Tereza.


Um simples brinquedo também é capaz de trazer felicidade. Há cinco anos, Lucineide Rodrigues de Oliveira, supervisora em um laboratório, escolhe aleatoriamente cartinhas de criança para o Papai Noel. Há, onde ela trabalha, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), o Instituto Sabin. A entidade fez neste ano uma parceria com a creche Recanto Feliz, localizada no Recanto das Emas, apadrinhando todas as 245 crianças do local com presentes.


Os pequenos escreveram pedidos e os colaboradores se voluntariaram para conceder os desejos. “É Deus que nos toca. Eu gosto de contribuir de alguma forma para que alguém se sinta melhor”, conta Lucineide. Contudo, por falta de tempo, ela nunca havia visitado os locais  que ajudou. “Às vezes, achamos que é só contribuir financeiramente ou com um presente e já serve”, reflete.


Maria Tereza dos Santos, entre Ilda e Tânia, mãe e filha que fabricam perucas para pa-cientes com câncer: 'Elas são meus anjos' (Vinícius Santa Rosa/Encontro/D.A. Press)
Maria Tereza dos Santos, entre Ilda e Tânia,
mãe e filha que fabricam perucas para pa-
cientes com câncer: "Elas são meus anjos"
Visitar pela primeira vez um lugar que ajudou foi especial para Lucineide. Logo que entrou, recebeu um beijo e um abraço espontâneos de uma das crianças e confessou que foi preciso segurar o choro. Rakelly Marques, de 6 anos, receberá o presente que Lucineide e alguns colegas de trabalho se reuniram para comprar. A garota quer uma bicicleta com rodinhas há muito tempo. “Eu desenhei a bicicleta, eu e minha irmã”, conta. De acordo com a diretora pedagógica da creche, Ivaneide da Costa, a instituição está sempre de braços abertos para receber os visitantes. “As crianças ficam felizes só com a presença, com alguém de fora que vem visitar. A maioria só precisa de atenção”, conta. A turma fez uma apresentação musical em agradecimento à visita de Lucineide. Dessa vez, não foi possível segurar as lágrimas.


O advogado Estênio Campelo também vive uma realidade distante da das pessoas que ajuda. Morador da Asa Sul, ele contribui com frequência para a Casa do Ceará, que, entre outras atividades, mantém o asilo Pousada dos Idosos. Estênio doou R$ 5 mil para a festa de Natal, além de outros R$ 20 mil, no ano passado, em benfeitorias. “Aprendi com a minha mãe que devemos ser solidários. Ela tinha esse perfil de caridade, que acabou se tornando parte de mim também”, diz Rubinita.

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