Faça o bem, olhe a quem
É comum praticar atos de solidariedade sem necessariamente conhecer a pessoa beneficiada. Mas esse encontro pode proporcionar momentos gratificantes
Morador do Recanto das Emas, Paulo Lafaiete de Lima, de 29 anos, foi o único entre três filhos de um casal de vigilantes a concluir a faculdade. Também é o único entre os irmãos que não enxerga. “Aproveitei as oportunidades, apesar de para mim ter sido mais difícil. Eles (os irmãos) não se interessaram”, diz Paulo. Formado em comunicação social, ele frequenta também aulas complementares de escrita cursiva, no Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais. Usa os audiolivros e as transcrições em braile da biblioteca do colégio para estudar para concursos. Alguns gêneros literários, como a poesia, têm menos oferta em linguagem adaptada.
O estudante acessa o site do projeto Purpurinar, idealizado pela escritora Adriana Ribeiro, onde encontra poesias e crônicas transformadas em áudio por voluntários. Sem sair de casa, homens e mulheres fazem leituras e abastecem a página da internet, sem ter ideia de quem ouvirá. “É muito interessante e abre opções de estilos literários. Ficamos muito presos em texto narrativo. Alguns voluntários entram no texto, leem com muito gosto”, relata Paulo.
Uma das vozes do Purpurinar pertence ao funcionário público José Clovis, morador do Sudoeste. Clovis conheceu na internet o projeto e quis doar-se de alguma maneira. Não imaginava que o poema gravado por ele seria ouvido e apreciado por Paulo Lafaiete. Os dois se conheceram em novembro, a convite de Encontro Brasília. Descobriram interesses em comum. “Depois que me aposentei, fui procurar projetos sociais para colaborar. O Purpurinar é maravilhoso, especialmente para quem não tem muito tempo ou não deseja assumir compromissos fixos presenciais”, explica Clóvis.
Existem várias maneiras de ajudar. Há um ano, a arte-educadora Tânia Alves Pinto, moradora de Taguatinga, descobriu a dela. A confecção de perucas para mulheres que perderam os cabelos devido ao tratamento contra o câncer ocupa a maior parte do tempo de Tânia e da mãe dela, Ilda Barbosa. A primeira costura os fios no forro da peruca. A segunda lava e penteia os cabelos doados. “No começo, não era um programa, fazíamos poucas perucas. Hoje, está com a força toda, graças às doações de cabelos. Aprendi a fazer as perucas porque me sinto muito bem em poder ajudar”, explica.
Quem recebe as perucas feitas por Tânia e Ilda sente-se melhor ainda. Quando Maria Tereza dos Santos, moradora de Águas Lindas de Goiás, casou-se, sua autoestima estava abalada. Careca e com o corpo inchado por conta da quimioterapia, ela tinha dificuldades em se enxergar bonita vestida de noiva. “Eu não queria desistir do casamento, mas também não queria casar careca. Estava deprimida, me sentindo frágil. Quando recebi a peruca, meu humor mudou totalmente. Levantou o meu astral. Eu vivi de novo”, diz Maria Tereza.
Um simples brinquedo também é capaz de trazer felicidade. Há cinco anos, Lucineide Rodrigues de Oliveira, supervisora em um laboratório, escolhe aleatoriamente cartinhas de criança para o Papai Noel. Há, onde ela trabalha, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), o Instituto Sabin. A entidade fez neste ano uma parceria com a creche Recanto Feliz, localizada no Recanto das Emas, apadrinhando todas as 245 crianças do local com presentes.
Os pequenos escreveram pedidos e os colaboradores se voluntariaram para conceder os desejos. “É Deus que nos toca. Eu gosto de contribuir de alguma forma para que alguém se sinta melhor”, conta Lucineide. Contudo, por falta de tempo, ela nunca havia visitado os locais que ajudou. “Às vezes, achamos que é só contribuir financeiramente ou com um presente e já serve”, reflete.
O advogado Estênio Campelo também vive uma realidade distante da das pessoas que ajuda. Morador da Asa Sul, ele contribui com frequência para a Casa do Ceará, que, entre outras atividades, mantém o asilo Pousada dos Idosos. Estênio doou R$ 5 mil para a festa de Natal, além de outros R$ 20 mil, no ano passado, em benfeitorias. “Aprendi com a minha mãe que devemos ser solidários. Ela tinha esse perfil de caridade, que acabou se tornando parte de mim também”, diz Rubinita.