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Cultura | Roteiro »

Fora do circuito turístico

Guia desenvolvido por aluna da UnB traça a rota dos locais preferidos por brasilienses, com dicas e depoimentos de moradores da capital

Isabela de Oliveira - Redação Publicação:02/04/2015 10:01Atualização:02/04/2015 10:42

Para a autora do guia, Isabela Bonfim, a cidade está vivendo um período de reafir-mação; 'Os moradores estão se identificando cada vez mais com a cultura local' (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Para a autora do guia, Isabela Bonfim, a
cidade está vivendo um período de reafir-
mação; "Os moradores estão se identificando
cada vez mais com a cultura local"
Isabela Bonfim sempre desconfiou que Brasília era a cidade mais linda do mundo. Uma percepção quase instintiva para uma jovem de 19 anos que, na época, ainda não tinha saído do Brasil. Em 2011, deu início a uma temporada de viagens para o exterior. No total, foram 28 países da Ásia, África e Europa. Na bagagem, trouxe uma certeza de suvenir: Brasília é, realmente, única.


 “Eu viajei bastante. Estava voltando para o Brasil e precisava fazer o trabalho de conclusão de curso (TCC) em comunicação social”, conta Isabela, que esperava que o projeto final não fosse um fardo, mas um projeto pessoal capaz de trazer alguma realização. E, pelo visto, trouxe. Aos 23 anos, ela assina a autoria do livro A cidade além do Congresso – Um guia para conhecer Brasília como brasiliense. Os poucos exemplares do livro já se esgotaram, mas ela pretende, em breve, encomendar nova tiragem. “Pessoas que eu não conheço me procuram para saber onde comprar”, comemora.


Mesmo que pesquisas tenham apontado Brasília como uma das cidades que oferece mais qualidade de vida no Brasil (como a publicada pela empresa Mercer no início de março), o livro não tem pretensão de afirmar que a capital federal é melhor do que qualquer outra cidade, mas que é, sem dúvida, diferente. E deixa a todos um convite: a cidade de gente que come, bebe e se diverte, independentemente da veia política, deve ser vista. Até decidir declarar sua paixão pela capital, Isabela cogitou escrever sobre países inusitados para onde viajou. Mas, depois de refletir, percebeu que tinha mais compromisso com a própria cidade. Por vários motivos. “Primeiro porque falta essa visão mais turística de Brasília, segundo porque a cidade está vivendo um período de reafirmação por parte dos moradores que estão se identificando cada vez mais com ela e com a cultura local, e terceiro porque amo Brasília mesmo. Para mim, é a cidade mais linda do mundo”.


O projeto de Lucio Costa é dividido em quatro escalas – monumental, gregária, residencial e bucólica. O guia criado por Isabela para concluir o curso na Universidade de Brasília (UnB) segue o mesmo raciocínio para separar os capítulos e pontos turísticos da cidade. O arquiteto Eliton Brandão, coordenador do curso de design de interiores do Centro Universitário Iesb, explica que as pessoas circulam, todos os dias, por todas elas. “Costumo dizer que as experimentamos diariamente. Quando entendemos como funciona, acabamos gostando mais da cidade e vivendo melhor, porque é como se tivéssemos um manual para usá-la.”


Reduto underground da cidade, o centro comercial Conic é um 
dos pontos de encontro citados no livro A Cidade Além do Congresso (Minervino Júnior / CB/ DAPress)
Reduto underground da cidade, o centro comercial Conic é um dos pontos de encontro citados no livro A Cidade Além do Congresso
A escala gregária consiste nos centros comerciais e áreas de diversão, isto é, onde as pessoas convergem. Brasília, cidade criada para automóveis, possui como maior região gregária a Plataforma Rodoviária. O Conic, prédio no Setor de Diversões Sul, também entra na escala. Não é um lugar que costuma entrar nos roteiros turísticos, mas que é imperdível por traduzir bastante da cultura underground brasiliense. É também um dos lugares preferidos de Alex Vidigal Rodrigues de Sousa, professor de audiovisual da Universidade Católica de Brasília. Ele conta que na infância e adolescência morou em diversas regiões administrativas. Uma constante, entretanto, era o Conic, prédio onde os pais mantinham uma ótica. “Eu me considero educado pela cultura alternativa que existe lá e chego a chamar o Conic de minha casa”, conta Vidigal, lembrando a influência que o Sebinho do Seu Ivan, os quadrinhos da Kingdom Comics, LPs da Berlim e CDs de rap na Pro Vinil tiveram em sua formação cultural.


Brasília também está moldando o jeito de ser do professor de artes William Quintal, que chegou à capital em 2011. Inicialmente, estranhou a cidade. “Odiei”, admite ele, contando que a percepção mudou quando notou que existe “uma Brasília dentro de Brasília”. “Tem a camada externa que é seca igual ao tempo, mas tem outra muito humana e honesta, direta amável, sem frescuras. Brasília tem espaço para se recriar, fazer uma versão melhor de você mesmo, se quiser”, diz o mineiro de Belo Horizonte. “A cidade tem uma forma de viver que é só dela: se você aceita e acolhe, ela o acolhe também; se você lutar contra, ela não é legal com você.”


 (Viola Jr/Esp CB/DA Press)
O Cine Drive-in, na Área Especial do Autódromo, na Asa Norte, é um dos lugares preferidos de William. Quando o filho caçula, Antonio, estava para nascer, a família precisou incorporar o carro ao dia a dia. Na mesma época, ele e a mulher, Lilian, ouviram no rádio a apresentação de um documentário no Cine Drive In. “Achamos o máximo e fomos conhecer. Os carros são uma parte fundamental de como Brasília foi pensada originalmente. Ir ao Cine Drive-in foi como fazer uma viagem à utopia de Brasília, foi como experimentar um pouco da ideia de futuro que inspirou a cidade.”


Eliton Brandão explica que a escala residencial é, grosso modo, as laterais do Eixo Monumental, as asas do avião. Nela existem os condomínios das superquadras – entre elas, a superquadra modelo da 308 Sul se destaca por se aproximar ao máximo do projeto original de Lucio Costa –, casas geminadas das vias W3 e individuais dos Lagos. “Se você caminha por eles, especialmente nas entrequadras, observa jardins e áreas verdes que constituem a escala Bucólica, e que em Brasília é fantástica”, conta o arquiteto, declarando amor particular a essa característica brasiliense.

 

 


Natural de Salvador, Eliton mora em Brasília desde os 8 anos de idade. Assim como Isabela, conhece várias cidades do Brasil e do mundo. “Mas Brasília é diferente de tudo porque passeamos em um jardim para chegar a todo e qualquer lugar. É a nossa grande identidade”, conta o professor, que é especialmente fascinado pela Torre de TV. “É apenas uma grande antena, mas está no centro da cidade com um desenho limpo e bonito para nos lembrar que, quando Brasília foi construída, o sentimento nacional era de transformar o Brasil no país da comunicação e da tecnologia, e foi isto que permitiu que o projeto de Lucio Costa fosse campeão: a esperança de desenvolvimento”.

 

O Cine Drive-in e o Conic, na área central de Brasília, são ícones da cidade: opções de passeios que passam longe das indicações de guias turísticos tradicionais (Viola Jr/Esp CB/DA Press)
O Cine Drive-in e o Conic, na área central de Brasília, são ícones da cidade: opções de passeios que passam longe das indicações de guias turísticos tradicionais
 

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