Fora do circuito turístico
Guia desenvolvido por aluna da UnB traça a rota dos locais preferidos por brasilienses, com dicas e depoimentos de moradores da capital
“Eu viajei bastante. Estava voltando para o Brasil e precisava fazer o trabalho de conclusão de curso (TCC) em comunicação social”, conta Isabela, que esperava que o projeto final não fosse um fardo, mas um projeto pessoal capaz de trazer alguma realização. E, pelo visto, trouxe. Aos 23 anos, ela assina a autoria do livro A cidade além do Congresso – Um guia para conhecer Brasília como brasiliense. Os poucos exemplares do livro já se esgotaram, mas ela pretende, em breve, encomendar nova tiragem. “Pessoas que eu não conheço me procuram para saber onde comprar”, comemora.
Mesmo que pesquisas tenham apontado Brasília como uma das cidades que oferece mais qualidade de vida no Brasil (como a publicada pela empresa Mercer no início de março), o livro não tem pretensão de afirmar que a capital federal é melhor do que qualquer outra cidade, mas que é, sem dúvida, diferente. E deixa a todos um convite: a cidade de gente que come, bebe e se diverte, independentemente da veia política, deve ser vista. Até decidir declarar sua paixão pela capital, Isabela cogitou escrever sobre países inusitados para onde viajou. Mas, depois de refletir, percebeu que tinha mais compromisso com a própria cidade. Por vários motivos. “Primeiro porque falta essa visão mais turística de Brasília, segundo porque a cidade está vivendo um período de reafirmação por parte dos moradores que estão se identificando cada vez mais com ela e com a cultura local, e terceiro porque amo Brasília mesmo. Para mim, é a cidade mais linda do mundo”.
O projeto de Lucio Costa é dividido em quatro escalas – monumental, gregária, residencial e bucólica. O guia criado por Isabela para concluir o curso na Universidade de Brasília (UnB) segue o mesmo raciocínio para separar os capítulos e pontos turísticos da cidade. O arquiteto Eliton Brandão, coordenador do curso de design de interiores do Centro Universitário Iesb, explica que as pessoas circulam, todos os dias, por todas elas. “Costumo dizer que as experimentamos diariamente. Quando entendemos como funciona, acabamos gostando mais da cidade e vivendo melhor, porque é como se tivéssemos um manual para usá-la.”
Brasília também está moldando o jeito de ser do professor de artes William Quintal, que chegou à capital em 2011. Inicialmente, estranhou a cidade. “Odiei”, admite ele, contando que a percepção mudou quando notou que existe “uma Brasília dentro de Brasília”. “Tem a camada externa que é seca igual ao tempo, mas tem outra muito humana e honesta, direta amável, sem frescuras. Brasília tem espaço para se recriar, fazer uma versão melhor de você mesmo, se quiser”, diz o mineiro de Belo Horizonte. “A cidade tem uma forma de viver que é só dela: se você aceita e acolhe, ela o acolhe também; se você lutar contra, ela não é legal com você.”
Eliton Brandão explica que a escala residencial é, grosso modo, as laterais do Eixo Monumental, as asas do avião. Nela existem os condomínios das superquadras – entre elas, a superquadra modelo da 308 Sul se destaca por se aproximar ao máximo do projeto original de Lucio Costa –, casas geminadas das vias W3 e individuais dos Lagos. “Se você caminha por eles, especialmente nas entrequadras, observa jardins e áreas verdes que constituem a escala Bucólica, e que em Brasília é fantástica”, conta o arquiteto, declarando amor particular a essa característica brasiliense.
Natural de Salvador, Eliton mora em Brasília desde os 8 anos de idade. Assim como Isabela, conhece várias cidades do Brasil e do mundo. “Mas Brasília é diferente de tudo porque passeamos em um jardim para chegar a todo e qualquer lugar. É a nossa grande identidade”, conta o professor, que é especialmente fascinado pela Torre de TV. “É apenas uma grande antena, mas está no centro da cidade com um desenho limpo e bonito para nos lembrar que, quando Brasília foi construída, o sentimento nacional era de transformar o Brasil no país da comunicação e da tecnologia, e foi isto que permitiu que o projeto de Lucio Costa fosse campeão: a esperança de desenvolvimento”.