Encontro de vocações
Brasília sedia, no primeiro final de semana de dezembro, o festival Mercado Mundi, com uma proposta inovadora para discutir a culinária global e o futuro da alimentação
O evento tem curadoria e realização do Grupo AG, que atua em projetos nacionais e internacionais em áreas como arte, design, arquitetura e tem vasta experiência e propostas de caráter social. À frente da equipe está o italiano Nicola Goretti, morador de Brasília desde 2001. Com vocação para projetos de grande repercussão, ele conta que a ideia surgiu depois que a Embaixada da Itália o convidou a fazer em Brasília uma programação paralela à Expo Milão 2015, cujo tema era alimentação, com o mote Feeding the Planet: Energy for Life. A pro- posta era instigar brasilienses a irem a Milão. Acabou não dando certo, mas, mesmo assim, ele nutriu a ideia de trazer para o Brasil uma proposta que levasse à discussão sobre o que está sendo produzido e consumido no país. “Vemos muitas notícias ruins, falando que o Brasil é um dos países que mais contamina os alimentos, mais usa agrotóxicos. Mas temos também notícias boas. Por que não falar sobre as coisas bacanas que estão sendo feitas?” diz.
A proposta, segundo Nicola, é que este seja um festival voltado para a cidadania: “Não é um projeto de gastronomia só, é um projeto de alimentação. Esta situação se diferencia dos projetos com os quais estamos acostumados na cidade porque a intenção é que as pessoas parem para pensar no que estão comendo. Vamos falar de futuro e sobre a nossa saúde.” Não por acaso, o objetivo do grupo é expandir o evento para outras regiões brasileiras, especialmente Sudeste e Nordeste. O curador afirma que nossa cultura gastronômica é uma das mais ricas do mundo, mas, curiosamente, ainda não é considerada cultura. “Há um trabalho enorme a ser feito”, completa.
A programação desta primeira edição está sendo formulada, mas os brasilienses poderão assistir a pelo menos 12 palestras sobre temas diversos, desde slow food até gestão de resíduos. Antonio Felix Domingues, gerente-geral de Articulação e Comunicação da Agência Nacional de Águas (ANA), por exemplo, vai falar sobre “Água no Brasil e no mundo: tendências e desafios”. Já o presidente da grife de carnes Beef Passion, Ricardo Secchis, apresentará a “Produção sustentável no Brasil: o boi e suas virtudes”.
Uma meta dos organizadores é que os pequenos produtores sejam mais conhecidos, tenham contato direto com o público, pois consideram que muitos deles vendem itens de ótima qualidade, mas têm dificuldade de escoar sua produção. “Nos estandes teremos restaurantes representando a culinária de diversas partes do mundo: indianos, mexicanos, italianos... será um cardápio rico, de verdade”, conta Nicola.
Outro destaque são as aulas-show, apresentadas por cozinheiros que, em sua maioria, trabalham com produtos da terra. Simon Lau, que inaugurou recentemente seu Aquavit dentro do Jardim Botânico, é um dos convidados. Ele vai falar sobre a cozinha contemporânea dinamarquesa fazendo, ao vivo, dois de seus famosos sanduíches abertos: o smorrebrod de boeuf tartar e guariroba e o smorrebrod de batata com maionese de tucupi, cebola frita e flores de jambu.
O co-curador do evento, Sebastian Pasarole, coordenador do curso de gastronomia do Iesb, chama a atenção para uma atividade chamada Gula Cultural, na qual dois cozinheiros, provenientes de lugares e culturas distantes, vão preparar um menu em conjunto. Cada dia uma dupla se apresenta, começando por Max Sommo e Marcos Lelis (Brasil e Argentina). A atividade é baseada no diálogo pacífico que a cozinha oferece, um inventário de novas maneiras para pensar o futuro da alimentação, a quatro mãos. “As ideias são parecidas com eventos de países como Itália e França, que, reúnem, fundamentalmente, os melhores produtores do mundo. Brasília vai ter um fim de semana de cultura e novos conceitos em alimentação, saúde e qualidade de vida. São coisas que têm muito a ver.”
Universitários de cursos de comunicação e design terão também espaço no evento com uma exposição fotográfica sobre questões sociais associadas à alimentação. As crianças têm uma programação de cursos voltados especialmente para elas. E há, ainda, a realização do Slow Filme - Festival Internacional de Cinema e Alimentação, que acontece há seis anos em Pirenópolis. A mesma equipe que o realiza (Objeto Sim Projetos Culturais, com curadoria do crítico e professor de cinema Sérgio Moriconi) traz pela primeira vez para Brasília curtas e longas-metragens com temas como a sustentabilidade, a qualidade artística cinematográfica, a identidade dos povos e o respeito às diferenças. Agora é só aguardar e se programar para degustar!