A pirâmide da paz
O Templo da Boa Vontade, monumento mais visitado de Brasília, reúne arquitetura arrojada, espiritualidade e cultura. Ali, brasilienses e estrangeiros experimentam rituais para renovar as energias
Em média, 80 mil pessoas passam a cada mês pelo templo, fazendo desse o monumento mais visitado da capital federal, segundo a administração do local. Eleito uma das sete maravilhas de Brasília pela população em pleito realizado pela Secretaria de Turismo do DF, o monumento conta com ambientes diversos. Uma nave sob a pirâmide permite que o visitante se coloque exatamente abaixo do gigantesco cristal. Há ainda uma galeria de arte, uma sala dedicada à cultura egípcia, duas fontes de água, uma que brota com água purificada pelo cristal, e memoriais dedicados ao primeiro e ao atual presidentes da LBV, Alziro Zarur e Paiva Netto. Uma biblioteca com sala de estudos é outra atração importante. Além do apelo individual de cada ambiente, a proposta ecumênica cercada de elementos esotéricos agrada muito aos brasilienses e turistas. É possível, no entanto, para a pessoa mais descrente usufruir do templo. Repleta de obras de arte as mais diversas e dona de arquitetura peculiar, o lugar se tornou popular pela diversidade e acolhimento, mais do que qualquer crença específica.
Ao entrar no templo, o primeiro local que se encontra é a nave, que, além do cristal, conta com elementos de arte e criações simbólicas para tradução de uma experiência transformadora. É a nave que fica sob a pirâmide única de sete faces. Ao lado da guia Lina Silva, é possível conhecer cada detalhe do projeto. Em frente ao altar, inicia-se uma caminhada por pedras escuras que leva ao centro, abaixo do cristal. O retorno, pelas pedras claras, leva mais uma vez à frente do altar de Deus, onde está inscrita a frase “Todo dia é dia de renovar nosso destino”. A dinamarquesa e professora de metafísica e evolução humana, Marina Munk, veio ao local pela primeira vez em 1993. Ela ficou arrebatada pela proposta espiritual do templo que considera ter tudo a ver com a cultura brasileira, baseada no acolhimento. Morando no estado do Amazonas desde então, ela vem a Brasília para visitar o TBV ao menos três vezes por ano. Geralmente, traz consigo grupos de cidadãos de diversas partes do mundo, a maioria europeus, para conhecer o lugar. “Aqui recebi minha missão e tive contato com coisas do meu interior”, conta a professora em português correto e sotaque carregado.
Além do grupo que acompanha Marina, a nave recebe outras 10 pessoas numa tarde de quinta-feira. Por ali, o movimento nunca para. A nave fica aberta 24 horas porque, como explica a guia, não há hora para se precisar de uma renovação de energia. Outro local extremamente popular do templo é a Sala Egípcia. Com entrada a 2 reais, o local funciona em parte como museu, parte homenagem à cultura milenar e parte como sala de meditação. O encontro semanal para meditação em grupo na sala, aliás, é um dos eventos mais procurados no templo. Cada detalhe foi minuciosamente pensado. As cores terrosas no chão e nas paredes contrastam com o azul do teto, fazendo alusão direta às cores do próprio Egito. As principais divindades, bem como cenas da antiga cultura egípcia, estão pintadas nas paredes e colunas. É possível aproveitar o mobiliário e sentar nas cadeiras e poltronas. A ideia é que o visitante passe bastante tempo por ali. Guias especializadas na sala contam a história por trás de cada uma das imagens. “Quando compara- da a nossa sociedade, é impressionante o quanto a cultura egípcia era avançada”, avalia Lina Silva.
Outros ambientes guardam mais relíquias, presentes que o templo e a LBV receberam de variados amigos: diplomatas, artistas, governos, representantes religiosos. No salão nobre, entre a nave e a Sala Egípcia, um enorme painel representando a evolução da humanidade traz retratos de grandes personagens da história. Políticos, líderes religiosos, artistas, inventores, brasileiros e estrangeiros, vivos ou falecidos. Na galeria de arte, a variedade continua. Um baralho de tarô gigante com arcanos inspirados em locais e monumentos brasilienses divide espaço com um espelho francês do século 18, feito em cristal, e com moldura talhada à mão. A galeria recebe ainda exposições temporárias com frequência. Na ampla sala, o artista plástico Toninho de Souza termina de preparar sua exposição Toninho de Souza e os Artistas do Mundo, aberta ao público até 18 de novembro. “O templo é uma instituição ecumênica que acolhe os povos do mundo e propaga amor. Por isso mesmo, tem tanta arte, uma forma tão importante de traduzir o amor”, diz o artista.
Uma obra permamente e definidora do templo é a Mandala, criação da artista plástica alemã Ula Haensell, que consiste num painel de cristal montado em parede de mármore. A ideia é simbolizar o ecumenismo total. Ali também, visitantes procuram energias positivas transformadoras ao se aproximarem do local. Em cada um desses espaços, da nave à Sala Egípcia, da galeria de arte à Mandala, a arquitetura privilegia plantas e jardins, além de permitir a entrada de luz natural. A temperatura amena e a umidade alta são graças a uma das duas fontes localizadas no centro do templo. A maior foi concebida para fins de paisagismo e como fonte de umidade e frescor. Ela se tornou fonte dos desejos e tem o fundo pontuado por moedas diversas. É lar de peixes e tartarugas, animais queridos dos funcionários. A outra fonte, própria para beber, traz água purificada pela energia do cristal da pirâmide ao passar por baixo dele. Ela fica estrategicamente colocada ao lado de uma estátua de Jesus com a mão levantada. Assim, quem busca a água é aboençoado, explica a guia.
A calma do local agrada ainda a muitos estudantes que buscam a sala de estudos do templo. É comum, contam os funcionários, que antes das 9h horário de abertura do centro, uma fila peculiar de mochilas apareça na porta de vidro da sala para garantir aos primeiros o direito de entrar o quanto antes, um ritual criado pelos próprios frequentadores. O administrador do TBV, Paulo Medeiros, conta ainda que há casos de visitantes que vieram de outras cidades, estados e países apenas para conhecer ou revisitar o templo. Inaugurado há 26 anos, o TBV é sonho do fundador da Legião da Boa Vontade, Alziro Zarur, desde a década de 1920. “A ideia por trás do templo é que ele seja um agasalho de sentimentos”, sintetiza Paulo Medeiros. O lugar, segundo ele, tem tudo a ver com a capital federal. Isso porque ali há congruência de ideias, conhecimento e sentimentos, assim como o Distrito Federal reúne a diversidade do brasileiro. “O Templo da Boa Vontade é uma homenagem a todo o país”, explica.