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Baluarte monumental

Tanques de guerra, canhões decorativos, olhares vigilantes de soldados camuflados: o QG do Exército é uma verdadeira cidade dentro de Brasília, com peculiaridades que pouca gente faz ideia

Romário Costa - Redação Publicação:03/05/2016 12:59Atualização:05/05/2016 09:57
 (Ed Alves/CB/DA Press)
 
 
A sargento Maria Rocha vive a 
rotina do Setor Militar Urbano 
há três anos: fácil acesso, 
serviços e qualidade de vida (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
A sargento Maria Rocha vive a
rotina do Setor Militar Urbano
há três anos: fácil acesso,
serviços e qualidade de vida
A rotina do Setor Militar Urbano (SMU) tem momento certo para começar e para terminar e, geralmente, não atrasa. Os mais de 12 mil militares envolvidos nos serviços do Exército Brasileiro dão vida ao setor que é mais autossuficiente do que a maioria das regiões do Distrito Federal. “O SMU fica localizado no centro de Brasília, numa região privilegiada e de fácil acesso, com linhas de ônibus exclusivas, vila militar, clubes, restaurantes, agências bancárias, hospital e segurança 24 horas”, enaltece a sargento Maria Rocha, que trabalha na Base Administrativa do Comando Militar do Planalto. Para a oficial, que vive a rotina do SMU há três anos, todos esses aspectos garantem uma boa qualidade de vida.

Apesar de estar na região central de Brasília, a atmosfera é bem diferente das asas do Plano Piloto. Até nos passos sincronizados dos soldados que se exercitam nas primeiras horas da manhã – tudo no SMU parece seguir uma ordem, uma disciplina. A vila que concentra os principais serviços do Exército brasileiro na capital federal tem em sua rotina valores tradicionais da vida militar. O conjunto arquitetônico do bairro impressiona pela imponência e originalidade. Com um verdadeiro acervo a céu aberto, e outras tantas obras de acesso restrito, o local é um primoroso representante da cultura brasiliense.
 
O Quartel-General é um conjunto de 10 grandes edifícios e abriga o Comando do Exército. Chamado por Niemeyer de Palácio do Exército, o prédio foi estudado para que sua forma e estrutura fossem indevassáveis. Por isso, existem pouquíssimas entradas pela área externa e todas são estrategicamente distribuídas. Os outros portais são voltados para o interior do quartel (Monique Renne/Esp. CB/DA Press)
O Quartel-General é um conjunto de 10 grandes edifícios e abriga o Comando do Exército. Chamado por Niemeyer de Palácio do Exército, o prédio foi estudado para que sua forma e estrutura fossem indevassáveis. Por isso, existem pouquíssimas entradas pela área externa e todas são estrategicamente distribuídas. Os outros portais são voltados para o interior do quartel
 
O filósofo Michel Foucault já dissera que o poder está associado a uma série de símbolos. E que esses elementos é que formam um sujeito ou uma entidade poderosa. Oscar Niemeyer parecia estar em plena sintonia com o pensamento do francês ao criar as principais obras do SMU. O Quartel-General do Exército (QGEx); o Monumento a Duque de Caxias, Concha Acústica; o Oratório do Soldado e a Praça dos Cristais compõem o Conjunto Cívico do Quartel General do Exército e é parada obrigatória para amantes da arquitetura ousada de Niemeyer. Por lá, também há a contribuição de outros catedráticos, como Burle Marx e Athos Bulcão.
 
A visitação ao Oratório do Soldado é livre nos horários de expediente e também acontecem missas às quintas-feiras, às 19h30, e aos domingos, às 19h. O local é bastante disputado para casamentos (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
A visitação ao Oratório do Soldado é livre nos horários de expediente e também acontecem missas às quintas-feiras, às 19h30, e aos domingos, às 19h. O local é bastante disputado para casamentos
 
Homenagem: a composição entre a Concha Acústica e o Obelisco faz referência ao copo e à espada de Duque de Caxias, patrono do Exército brasileiro (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Homenagem: a composição entre a Concha Acústica e o Obelisco faz referência ao copo e à espada de Duque de Caxias, patrono do Exército brasileiro
 
 
Construído entre 1969 a 1973, no período mais ferrenho do regime militar, o QGEx consegue transmitir a mensagem de poder da instituição de maior influência na sociedade àquela época. A simbologia em torno dos elementos estéticos reforça uma ideia que é transmitida de maneira muito natural, até mesmo para quem não é militar. Os blocos de concreto imensos alocados paralelamente na vertical parecem dizer o quão pequeno é um indivíduo diante de uma obra tão imponente. Os gestos padronizados e a exaltação de símbolos nacionais, automaticamente, ajustam o comportamento visitante no local.

Lá trabalham o comandante do Exército e seus órgãos de assistência direta. Em 117 mil m² de área construída, é abrigo de 34 organizações militares. Mas o QGEx é muito mais do que se pode ver: o subsolo esconde preciosidades, como um dos maiores painéis construídos por Athos Bulcão, de 516 m², que decora uma das gigantescas garagens subterrâneas do quartel. De uso restrito, ela dá acesso a um túnel de uso também privativo a autoridades.
 
O subsolo do QGEx esconde preciosidades: um dos maiores painéis construídos por Athos Bulcão, de 516 m2, está numa gigantesca garagem subterrânea do quartel (Raimundo Sampaio/Encontr/DA Press)
O subsolo do QGEx esconde preciosidades: um dos maiores painéis construídos por Athos Bulcão, de 516 m2, está numa gigantesca garagem subterrânea do quartel


Essa galeria subterrânea liga o quartel ao teatro e à Concha Acústica. Pelo extenso corredor branco já passaram vários presidentes, desde os da era militar até Dilma Rousseff. “A estrutura ainda é a da época da construção. O mármore do piso e os revestimentos continuam intactos”, diz o guia da reportagem, coronel Carlos Duarte Pontual de Lemos, enaltecendo a qualidade do material que foi utilizado no local.
 
No saguão do Teatro Pedro Calmon há uma exposição permanente de peças históricas do Museu de Armas do Exército Brasileiro. A visitação é livre, de segunda a sábado, das 9h às 17h (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
No saguão do Teatro Pedro Calmon há uma exposição permanente de peças históricas do Museu de Armas do Exército Brasileiro. A visitação é livre, de segunda a sábado, das 9h às 17h
 
 
O fim do corredor dá diretamente na coxia do Teatro Pedro Calmon, uma construção sóbria, que reserva nos detalhes a personalidade de seus projetistas. Em madeira e com curvas que lembram as edificações de concreto espalhadas pela cidade, “o teto foi pensado para a perfeição acústica das apresentações”, afirma o tenente Atair Mieres, gestor do espaço. Um grande painel de Athos Bulcão decora uma das paredes laterais. Há também bolhas que permitem que qualquer atividade possua tradução simultânea em diferentes línguas, desde quando o teatro foi inaugurado. Com 1.164 lugares, o espaço, hoje, é uma das principais alternativas para realização de espetáculos, depois do desfalque cultural que o fechamento do Teatro Nacional causou.
 
Teatro Pedro Calmon (Raimundo/Encontro/DA Press)
Teatro Pedro Calmon
 
Teatro Pedro Calmon (Gustavo Moreno/CB/DA Press)
Teatro Pedro Calmon
 
 
Fachada do Teatro Pedro Calmon (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Fachada do Teatro Pedro Calmon
 
 
O monumento a Duque de Caxias, conhecido como Concha Acústica, é mais uma obra peculiar de Niemeyer. Inaugurado em 1973, é um palanque ao ar livre, com uma cobertura em forma de concha. Nela acontecem solenidades oficiais importantes e até concertos, a exemplo do apresentado pela Orquestra Sinfônica da Brasília, no último 7 de setembro. A composição entre a Concha Acústica e o Obelisco faz referência ao copo e à espada de Duque de Caxias, patrono do Exército brasileiro. Atrás da concha, está a entrada principal do quartel, que dá acesso ao salão Guararapes.
 
Salão Guararapes (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Salão Guararapes
 
 
A primeira obra do Salão Guararapes representa a batalha que dá nome ao espaço. Reprodução do famoso quadro do artista brasileiro Victor Meireles, o tapete representa o nascimento do Exército brasileiro. Nessa batalha, um grupo mestiço e improvisado expulsou os holandeses do Nordeste brasileiro. Foi a primeira vez que foi registrado o uso da palavra %u201Cpátria%u201D para se referir a esse território. A peça, de 12 metros de comprimento e 6 de largura, foi confeccionada por 25 artesãs de Lago do Carro (PE). Nela foram utilizados 125 kg de lã, de 35 cores (Gustavo Moreno/CB/DA Press
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A primeira obra do Salão Guararapes representa a batalha que dá nome ao espaço. Reprodução do famoso quadro do artista brasileiro Victor Meireles, o tapete representa o nascimento do Exército brasileiro. Nessa batalha, um grupo mestiço e improvisado expulsou os holandeses do Nordeste brasileiro. Foi a primeira vez que foi registrado o uso da palavra %u201Cpátria%u201D para se referir a esse território. A peça, de 12 metros de comprimento e 6 de largura, foi confeccionada por 25 artesãs de Lago do Carro (PE). Nela foram utilizados 125 kg de lã, de 35 cores
 
 
O espaço, que é a entrada de autoridades, conta com um conjunto de obras permanente, aberto para visitação ao público apenas de sexta a domingo. “Todo esse acervo conta um pouco da história de momentos emblemáticos do Exército do Brasil”, adianta o tenente Antonio Carlos Lorentz Ripe, guia do salão. “O nome do local se refere à Batalha dos Guararapes, que pôs fim à ocupação holandesa no Nordeste e é o marco inicial do Exército brasileiro”, ressalta o oficial.

Em frente à Concha Acústica está a Praça dos Cristais. Lá, é possível observar o requinte do trabalho do paisagista Burle Marx. Os cristais que dão nome à praça parecem emergir dos pequenos laguinhos, e o efeito, em um dia claro com nuvens, encandeia os visitantes, como a contadora Juliana Nascimento: “Essa praça é um daqueles tesouros escondidos em Brasília. Mesmo morando a vida inteira aqui, só descobri há alguns anos que ela existia. Daí me perguntei: ‘Como eu nunca vim a esse lugar antes?’ Depois da primeira visita, esse se tornou um dos meus lugares favoritos”, declara a brasiliense. Projetada por Roberto Burle Marx, o local é um jardim triangular de 102 mil m², que faz referência a cidade goiana de Cristalina. A ideia era descrever, por meio da obra, a riqueza existente na região central do Brasil.
 
Juliana Nascimento é frequentadora da Praça dos Cristais: 'Mesmo morando a vida inteira em Brasília, só descobri há alguns anos que ela existia', conta (Romário Costa/Esp. Encontro/DA Press)
Juliana Nascimento é frequentadora da Praça dos Cristais: "Mesmo morando a vida inteira em Brasília, só descobri há alguns anos que ela existia", conta
 
 
Juliana considera que o fato de não ter muitos visitantes é um ponto a favor: “A praça é bem grande, então a sensação é de estar sempre meio vazia. Confesso que é essa paz e tranquilidade que me fazem voltar aqui mais vezes. É um lugar de contemplação da natureza e da arte de Burle Marx. Faço questão de trazer meus amigos de fora para conhecer”, diz. 
 
Praça dos Cristais (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Praça dos Cristais
 
 
De todos os lugares abertos à visitação, a tranquilidade de todo o Setor Militar atribui uma atmosfera de maior contemplação ao Oratório do Soldado. Talvez fosse essa mesmo intenção ao ser projetado. Observa-se uma contemplação silenciosa e impressionada em todas as pessoas que visitam o local. Ao olhar do lado de fora, a edificação lembra uma nave extraterrestre de filmes de ficção. Com pilastras que parecem suspender o prédio das águas do espelho d’água que o envolve, foi projetado pelo arquiteto carioca Milton Ramos e inaugurado em 1973. O prédio religioso completa o Conjunto Cívico do Quartel-General do Exército Brasileiro.
 
Oratório do Soldado no SMU (Raimundo Sampaio/Encontro/DA Press)
Oratório do Soldado no SMU
 
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