Os irmãos Arthur e André com os pais, Sandro e Alessandra Maia, família que faz aulas no projeto Sementes: vínculos fortalecidos pela convivência também nas atividades educativas
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Diversos espaços em Brasília têm se ocupado em educar os pequenos músicos desde os primeiros meses de vida, com acompanhamento durante o crescimento e atividades coletivas para reunir toda a família. É o caso do projeto Sementes – Música e Terapia, criado por Janaína Condessa, que trabalha com música há 15 anos. Seu lema diz muito sobre os objetivos em relação aos alunos: “Amor com desapego. Vínculo com autonomia”. A ideia é fornecer as ferramentas necessárias para que cada um tenha liberdade de desenvolver suas próprias capacidades. “Acreditamos que somente por meio do vínculo afetivo com as professoras a criança estará motivada ao conhecimento e à continuidade dos estudos em música”, diz a musicista e terapeuta. “Ao longo do tempo, algumas mudanças podem ser percebidas, como a interação saudável, concentração, domínio instrumental e controle do corpo e de emoções.”
A musicalização infantil pode abranger crianças entre 6 meses e 10 anos de idade. Normalmente, depois desse tempo, os pequenos escolhem um instrumento e aumentam os estudos em áreas mais específicas da música. Cada faixa etária tem um tipo de atividade diferente. Vale lembrar mais um ponto positivo: segundo especialistas, crianças que tocam um instrumento ou possuem algum aprendizado nesse segmento antes dos 5 anos apresentam a área frontal do cérebro, que abrange o conhecimento lógico e abstrato, mais desenvolvida.
A dança também está presente durante as aulas de Janaína, auxiliando na expressão corporal e no desenvolvimento psicomotor. “Como a música e os sons fazem parte do seu cotidiano, a criança interage com eles, na maioria das vezes de forma corporal, batendo palmas ou objetos, dançando, movimentando-se e cantando, entre outras formas de expressão”, explica. Mãe de Arthur, de 3 anos, e André, de 1, alunos do Sementes, Alessandra Maia conta como a família se engajou nas aulas. Ela perguntou ao mais velho se ele gostaria de entrar na turma de judô. “Ele me respondeu de pronto: ‘Quero fazer música, mamãe’. Foi quando encontramos o Sementes e a proposta de aula em família.” Também na companhia do pai, Sandro, todos cantam e brincam com os instrumentos. “O Arthur é tímido, tem vergonha até de dizer bom dia, mas se estiver com o violão toca uma música e cumprimenta as pessoas cantando”, diz Alessandra. “Acho muito bacana essa oportunidade de eles se expressarem pela música e se divertirem.”
Em geral, os pais participam das aulas dos filhos até por volta dos 4 anos de idade, mas isso pode variar de acordo com o contexto e principalmente de acordo com o preparo emocional e a autonomia dos alunos. “As trocas de experiências são estimuladas pelos professores nas aulas e depois devem ser vivenciadas em casa”, destaca o professor Ricardo Freire, coordenador do projeto Música para Crianças, da Universidade de Brasília (UnB). Criado em 2002, já atendeu aproximadamente 8 mil crianças do DF. Freire lembra que a atividade musical estimula a atenção, o propulsor da aprendizagem. Durante as aulas, as crianças são motivadas a prestar atenção primeiro e, em seguida, responder musicalmente: “Ao longo do tempo, a criança demonstra capacidade de cantar, dançar e controlar os movimentos para produção do ritmo. Crianças sempre me surpreendem ao sugerir ideias para as atividades e ao cantarem com autonomia”, diz o professor.
Maria Eduarda, de 5 anos, com a mãe, Fabrícia Chaves: desde pequeninha ela faz aulas no projeto de musicalização da UnB e adora tocar piano e cantar
Maria Eduarda, de 5 anos, e Maria Fernanda, de 1 ano e 9 meses, participam do projeto de musicalização da UnB. Mãe das duas, a analista de sistemas Fabrícia Chaves observa mais tranquilidade e uma grande melhora na concentração das filhas. Segundo ela, as aulas são boas também para os pais, que acompanham os filhos nos quatro anos de musicalização. “Temos um momento em que podemos nos conectar com os filhos, sem televisão e outras distrações”, diz Fabrícia. Apesar da pouca idade, Maria Eduarda, que está na fase de pré-instrumentalização, já avisou que pretende estudar violino ou piano: “Ela adora as aulas e faz alguns desenhos de si mesma cantando no microfone.”
A educadora musical Raiane Santana, que iniciou sua formação no projeto Sementes, afirma que as experiências vividas nos anos iniciais são importantes para o desenvolvimento cognitivo, intelectual e emocional da criança. “Durante uma aula, no momento do relaxamento, uma menina que estava deitada levantou-se ao ouvir as primeiras notas da canção Trou de Memoire, do compositor francês René Aubry, começou a dançar como uma bailarina e disse: ‘É a música da princesa!’”, lembra Raiane. “Desde então, essa canção tem outro significado para mim. Aquela menina me mostrou que na música posso ser o que eu quiser.”
A cantora Chris Dantas com a filha Letícia: "Ela já passou pelo piano, depois pelo violão e agora quer aprender flauta. Eu a deixo bem livre nessas escolhas", diz a mãe
A cantora e professora Chris Dantas viu seus estudos e teorias a respeito da educação musical se confirmarem na prática, em casa. Sua filha, Letícia Dantas, tem 8 anos e começou a apurar a audição musical ainda na barriga da mãe. “Durante a gestação ela já me ouvia. Também depois, desde os 2 meses, quando voltei a dar aula de música e canto. Com 6 meses ela começou a musicalização infantil e mais tarde passou a me pedir para tocar instrumentos. Primeiro, ela pediu o piano, depois violão e agora quer aprender flauta. Eu a deixo bem livre nessas escolhas”, diz a mãe. Chris afirma que nota em sua filha e em todas as crianças que fazem aula na sua escola, o Espaço Arte, uma grande melhora na concentração para a realização de todas as atividades do cotidiano. “A Lelê é uma criança muito agitada, elétrica. Quando começa a fazer as aulas de música, vira outra pessoa. Parece que cria um personagem, de tão concentrada que fica”, compara.
As aulas em grupo com as outras crianças, além do desenvolvimento emocional proporcionado pelos professores, auxilia na formação de uma boa autoestima e confiança da menina, que adora se apresentar. “Ela monta as coisas em casa para cantar, convida todo mundo para assistir quando aprende a tocar uma música nova no piano e se sente muito valorizada.” Outro ponto importante é o aumento do foco para os estudos e treinamento em outras atividades do cotidiano da menina, segundo Chris Dantas. “Eu nunca pedi que a Lelê estudasse os instrumentos. Quando chega em casa, por conta própria ela estuda as canções novas que aprendeu.”