CIÊNCIA
Especializado em microbiologia, Lucio de Freitas Junior ajuda a pesquisar uma das doenças mais alarmantes dos últimos tempos: a zika, um verdadeiro desafio para cientistas como ele
Durante muitos anos, a carreira do microbiólogo Lucio Holanda Gondim de Freitas Junior concentrou-se no exterior. Em 1999, ao concluir o doutorado na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ele foi fazer as pesquisas de pós-doutorado em Paris, no célebre Institut Pasteur. Passou quatro anos por lá, chefiando um grupo de cientistas, e depois embarcou para a Coreia do Sul, onde ficou por oito anos, no braço asiático da instituição francesa.
Os milhares de quilômetros de distância, contudo, não o afastaram dos problemas brasileiros. Ao contrário, na França ou na Coreia, a linha de investigação de Freitas Junior foi o desenvolvimento de medicamentos e vacinas para doenças negligenciadas, como malária, doença de Chagas e leishmaniose. Lá fora, trabalhou com tecnologia de ponta e de forma colaborativa de fazer ciência. Em 2013, voltou ao Brasil e assumiu o cargo de pesquisador no Grupo de Ação Rápida para Doenças Emergentes (Garde) do Instituto Butantan, de São Paulo. A chegada de Freitas Junior a uma das instituições científicas mais respeitadas do país não poderia ser mais oportuna. Em tempos de epidemia de zika, o mundo procura, desesperadamente, um medicamento que possa combater o vírus, cujos efeitos estão apenas começando a ser compreendidos.
Começar um remédio a partir do zero, porém, é algo demorado. Por isso, Freitas Junior e os outros pesquisadores do Garde arregaçaram as mangas do jaleco e foram atrás de compostos preexistentes que tenham potencial de enfrentar o micro-organismo. Eles começaram testando 725 medicamentos e chegaram a cinco, que foram desenvolvidos, originalmente, para o tratamento de câncer, infecções bacterianas e virais, e enjoos provocados pela quimioterapia. Se os resultados de testes futuros se confirmarem, essa última droga poderá, inclusive, combater os efeitos dramáticos da infecção do zika no cérebro.
O microbiólogo brasiliense reconhece a importância da produção acadêmica, mas critica o fato de muitos pesquisadores passarem a maior parte do tempo na frente de um computador, escrevendo artigos para publicar em revistas famosas. Para ele, é preciso colocar mais a mão na massa e ir atrás de respostas rápidas que tragam benefícios à população. Freitas Junior também defende uma troca mais intensa de conhecimento entre os cientistas.
“O Brasil tem os melhores cientistas do mundo, mas não estamos conectados”, lamenta. “Precisamos trocar informação, saber o que os outros estão fazendo, ajudar, colaborar. Isso é muito mais importante que produzir literatura científica. Nesse momento de epidemias, nós, cientistas, precisamos dar uma resposta coletiva à população. Temos de compartilhar conhecimento”, diz Freitas Junior, que elogia as condições tecnológicas e de material humano que encontrou no Butantan.
Afastado de Brasília desde 1995, quando foi estudar em São Paulo, o cientista visita a cidade ao menos uma vez por ano, para rever os pais, as irmãs e os sobrinhos. Ele diz que gosta muito da cidade, principalmente de lugares como a praça dos Três Poderes e o lago Paranoá. Foi aqui, aliás, que aprendeu a gostar de ciência. Embora a escolha de biologia na UnB tenha sido um tanto aleatória, o ex-aluno de colégios como Pio XII, Santa Rosa e Marista apaixonou-se pelo curso ao entrar, por engano, em um laboratório: “Virei um rato de laboratório e comecei a estudar para valer”, diz.