Professores driblam os desafios da educação para promover aulas dinâmicas, instigantes e interativas
Qual o segredo deles? O uso da tecnologia para auxiliar no ensino
Para lidar com os desafios constantes da educação, escolas de Brasília apelam para ferramentas tecnológicas. Há curso de inglês com um espaço todo equipado – até com impressora 3D e cortador a laser – para colocar a mão na massa em projetos de temas diversos. Tem professora de matemática que é youtuber, educador que promove jogos e competições entre os estudantes para resolução de problemas matemáticos on-line e professor de química que usa sites com animações para facilitar a visualização de átomos se desintegrando.
Para auxiliar o ensino dentro e fora de sala de aula, o Ministério da Educação (MEC) lançou o projeto Educação Conectada para escolas municipais e estaduais não ficarem de fora da era digital. “A tecnologia nunca vai substituir o professor. Ela ajuda a tornar as atividades mais produtivas para que sobre mais tempo para o professor se dedicar ao estudante”, afirma Clarissa Bezerra, professora de inglês há mais de 20 anos e especialista em inovação da Casa Thomas Jefferson. “Usar o celular e aplicativos para se divertir, essa geração jovem já sabe”, diz. O intuito da inovação na escola de idiomas, segundo ela, é capacitar professores para orientar os estudantes a aprender a usar as tecnologias para a aprendizagem. “O nosso objetivo é promover experiências singulares de aprendizagem”, completa a professora.
A unidade da Asa Norte conta com o Makerspace, um espaço de fabrica ção digital e analógica. O Makerspace é composto ainda por mesas, bancadas, computadores, saídas de energia e as mais variadas máquinas de produção. Há cortadora a laser, plotter de corte e impressoras 3D. Todas de uso livre por meio de agendamento e após passar por treinamento. O que chama mais atenção é uma parede coberta por ferramentas. Tanto alunos quanto a comunidade de Brasília podem usar o local para criar, experimentar e aprender na prática por meio de projetos, oficinas e workshops próprios ou propostos pela escola.
Luiz Fernando Silva Marques, de 16 anos, já usou o espaço para fazer peças e circuitos elétricos. Ele criou um porta-lápis e até um apagador gigante para quadro branco – um, não, o estudante acabou fazendo oito apagadores gigantes, tamanho o sucesso da invenção entre os professores. “Algumas peças eu tenho em casa”, diz Luiz Fernando. “Crio ferramentas para ajudar na minha rotina, como estruturas com cano, modelagens, peças úteis para o ambiente escolar. Eu me sinto mais motivado depois que conheci o lugar”, completa.
Em várias atividades promovidas no Makerspace, os estudantes são divididos em grupos e recebem um kit de ferramentas para colocar em prática a proposta do dia. “Podemos explorar bastante nossa curiosidade em cada máquina”, conta Giovanna Grande, de 12 anos. Em uma das atividades, ela teve de levar brinquedos antigos, desmontá-los e criar novos produtos. “Sair da zona de conforto ajuda a aprender, mas tem de ser corajoso”, diz Giovanna. “Às vezes, não sabemos nem por onde começar, afirma”. Hoje, ela é minimonitora em atividades para crianças menores. Outra estudante que aprende como se estivesse brincando é Isabel Monteiro, de 12 anos, do sétimo ano do Sigma. Nas aulas de matemática da professora Shalimar Vilar, há dias em que é realizada uma competição em grupo para disputar quem resolve uma equação matemática ou soluciona um problema mais rápido. A professora usa aplicativos em celulares para colocar a dinâmica em prática: “Às vezes, jogamos a aula toda. Fica todo mundo competitivo e leva muito para o lado da brincadeira. Por mim, toda aula podia ser assim”, diz Isabel.
Em outras aulas, a professora Shalimar conecta o tablet dela para que seja projetado na sala por meio do aplicativo My Black Board, cuja imagem imita uma lousa gigante. Já são sete anos que a tecnologia, por meio do uso de tablet, celular e muitos aplicativos, faz parte das atividades ministradas por Shalimar. Por causa das aulas criativas, os próprios alunos a incentivaram a colocá-las no Youtube para que possam consultá-las quando precisarem. “Criei o canal para os meus alunos do sexto e sétimo anos. Hoje, ele está com 3.100 inscritos”, conta a professora.
Toda a divulgação foi feita no boca a boca. “Os estudantes são do século XXI e os professores são do século XVIII. Temos de quebrar alguns paradigmas”, avalia Shalimar. A visão 3D de uma figura geométrica, por exemplo, facilita muito a aprendizagem. “Todos os jovens têm smartphone, assistem a vídeos no Youtube, usam a internet”, diz. “É como se fosse o caderno e o lápis deles, então há a necessidade de algo mais dinâmico, interativo”, diz. O resultado no engajamento deles, segundo ela, é recompensador.
O professor e coordenador de química do Galois, Euclides Chacon, lembra que quando começou a dar aula, nem computador havia na escola onde trabalhava. Com experiência de 35 anos, Euclides observa que a sociedade toda mudou: “E a escola nada mais é do que o reflexo da sociedade”, afirma. Atualmente, suas aulas de química são recheadas com o uso de sites para reproduzir imagens dos átomos se desintegrando, por exemplo. “Aquele assunto que era abstrato passa a ser mais palpável, principalmente em disciplinas como a química”, diz.
A ideia é aproximar o conteúdo da realidade e da linguagem do estudante para motivá-lo. “A participação dos alunos, hoje, é muito mais interativa, o estudante é mais dinâmico e questionador”, afirma Euclides. O que, segundo ele, exige uma formação continuada dos professores. Há muitos modelos, sites e aplicativos de excelente qualidade na internet, mas é preciso ficar atento. A seleção das ferramentas por um profissional qualificado, como o professor, é importante, principalmente para estudantes mais novos.
Lucas Vega, de 16 anos, está no terceiro ano do ensino médio e começou a assistir a documentários para se aprofundar no que havia estudado sobre a Revolução Francesa, ainda no oitavo ano do ensino fundamental. “Gosto de usar documentários para contextualizar melhor a atmosfera da época”, explica o estudante do Galois. Hoje, é adepto de videoaulas para estudar disciplinas variadas. Diagnosticado com Déficit de Processamento Auditivo Central (Dpac) aos 7 anos, Lucas nunca ficou de recuperação e serve de exemplo para os irmãos, um de 14 e outro de 11 anos. Os dois, inclusive, já assistiram ao documentário sobre a Revolução Francesa.
Andretti Pierre, professor de matemática do La Salle de Águas Claras, é outro profissional que não abre mão das possibilidades oferecidas pela tecnologia e não se importa de dar uma aula fora da sala tradicional. Ele costuma levar os alunos para um espaço paramentado por ilhas interativas, com objetivo de fazê-los testar os aprendizados na prática. Também faz uso de plataformas que possibilitam trabalhar com competitividade e jogos. “Coloco os alunos dentro do ambiente deles, que são os games e os computadores”, conta. Pierre reconhece, no entanto, que tudo isso dá mais trabalho ao professor. A tecnologia exige que o profissional estude a ferramenta e a ajuste até o ponto certo para usá-la com os estudantes. “Mas é compensador, porque o resultado é surpreendente. Os estudantes querem assistir às aulas de matemática, pois sempre esperam algo, e muitas vezes nem querem sair da sala depois que tudo acaba”, diz.
A Escola Americana de Brasília determina o acesso dos alunos à tecnologia de acordo com a faixa etária. Há desde pequenos conjuntos de tablets para as séries primárias, até o uso do próprio laptop com os aplicativos tecnológicos da escola para uso diário pelos estudantes mais velhos. “Avaliamos a eficácia do software com base em estudos publicados, recomendações de especialistas, experiência em sala de aula e resultados comprovados”, afirma Brian Sullivan, diretor de tecnologia da escola. Segundo ele, há um software, por exemplo, que proporciona estabelecer uma colaboração, tanto entre os colegas da escola quanto com alunos em qualquer lugar do mundo.
CAMINHOS PARA A APRENDIZAGEM
Professores indicam sites e aplicativos para ajudar nos estudos
è My Black Board: aplicativo que reproduz a tela do iPad do professor na sala de aula como se fosse uma lousa grande e, assim, dinamizar as aulas.
è Dourado virtual: jogo on-line gratuito com objetivo de trabalhar o aprendizado de centenas, dezenas e unidades.
è Canal no Youtube “Prof Shali”: a plataforma comporta vídeos em que Shalimar explica conteúdos de matemática por meio do aplicativo My Black Board.
Quem indica: Shalimar Vilar, professora de matemática do Sigma
è Khan Academy: permite que os estudantes testem os aprendizados. É uma ferramenta estrangeira e bem traduzida, disponível na internet de forma gratuita. Usada pelo professor para aulas de revisão.
è Matifique: plataforma que trabalha competitividade. Nela, é possível inserir os conteúdos para serem usados como um jogo nos moldes de videogame.
è Karoot: plataforma que gera um quiz. O professor disponibiliza as questões pelo iPad para os estudantes, que podem usar o próprio celular para participar.
Quem indica: Andretti Pierre, professor de matemática do La Salle
è Site www.phet.colorado.edu: o PhET Interactive Simulations (simulações interativas) é fruto de um projeto educacional da Universidade do Colorado (EUA). Ele disponibiliza, de graça, simulações para uso nas áreas de física, química, biologia, ciências da natureza e matemática. Elas contam com traduções em 65 idiomas, incluindo o português.
è Portal do professor do MEC: o site do Ministério da Educação oferece recursos didáticos voltado aos professores e aos estudantes no www. portaldoprofessor.mec.gov.br. Há uma aba de multimídia com, inclusive, vídeos aulas.
Quem indica: Euclides Chacon, professor e coordenador de química do Galois
è Seesaw: aplicativo para capturar imagens, vídeos e gravações de áudio dos trabalhos escolares realizados por eles. Ao longo do tempo, é possível formar um portfólio digital da produção de cada estudante.
è Common Sense Media: é um currículo de cidadania digital que ensina o uso apropriado e seguro da internet, além de abordar privacidade on-line, segurança de dados e o comércio existente com a venda de informações sobre usuário.
è TinkerCAD, Arduino, Scratch, Processing, XCode e PyCharm: programas usados pela escola para ensinar processos de design, codificação e sistemas computacionais aos estudantes.
Quem indica: Brian Sullivan, diretor de tecnologia da Escola Americana de Brasília