Brasileiro relata experiência com Ebola em Serra Leoa; 'Médicos sem Fronteiras' denuncia falta de apoio
Chega a 70% o índice de mortalidade dos pacientes. Os 30% dos pacientes restantes são o motivo pelo qual o médico carioca Paulo Reis, da organização não governamental (ONG) Médicos Sem Fronteiras (MSF), seguirá, pela segunda vez neste ano, para o país africano
Agência Brasil
Publicação:22/08/2014 08:44Atualização: 22/08/2014 08:58
Chega a 70% o índice de mortalidade dos pacientes infectados pelo vírus ebola em Serra Leoa, na África Ocidental, onde, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 783 pessoas já foram contaminadas. Entretanto, os 30% dos pacientes restantes são o motivo pelo qual o médico carioca Paulo Reis, da organização não governamental (ONG) Médicos Sem Fronteiras (MSF), seguirá, pela segunda vez neste ano, para o país africano.
“Quando o paciente sai do isolamento e recebe alta, tem festa, fazemos questão de apertar a mão até para que as outras pessoas veja que ele está bem", disse Reis. “É muito difícil descrever sentimentos, mas é uma emoção muito forte, colocar isso em palavras já não consigo”, acrescentou o médico, que veio de Serra Leoa há cerca de um mês, depois de tratar de 150 pacientes infectados.
Considerado um dos profissionais mais experientes no tratamento do ebola, Reis cuidou de doentes com o vírus na Guiné na primeira epidemia, em 2012, e considera o atual surto muito mais abrangente. “Nunca houve um número tão grande de pacientes, em uma área tão extensa. A doença está se espalhando e se tornou um problema amplo.”
Ele lembrou que, para entrar em um centro de tratamento de ebola, é preciso vestir uma roupa de proteção impermeável, que cobre o corpo e o rosto. O calor provocado pelo uniforme é tanto que torna-se impossível atender o paciente por mais de 40 minutos: “dentro da roupa é sempre muito quente e, se houver sol, rapidamente chega-se à exaustão. Às vezes, a condensação embaça os óculos por dentro e, às vezes, é preciso sair, pois não se enxerga nada.”
O trabalho é intenso: na última missão, eram atendidos, em média, 15 pacientes infectados por dia, em jornadas de cerca de 12 horas. Em toda Serra Leoa, há apenas um centro de tratamento, o do MSF, porque o do governo foi fechado depois que funcionários foram infectados, lembrou Paulo Reis.
Para ele, mesmo que houvesse um caso importado de ebola no Brasil, o impacto seria pequeno e a doença seria rapidamente contida. “Os hábitos culturais naqueles países contribuem para o contágio. É o caso dos rituais de enterro, em que se tem muito contato com a pessoa que morreu.” Reis citou também o hábito de comer morcego e macaco, potenciais transmissores do ebola, entre os que facilitam a contaminação. Se o surto é um perigo remoto no Brasil, nos países africanos atingidos pela doença, a situação é alarmante, alertou. Antigamente, disse Reis, os surtos eram controlados em dois três meses, mas agora não dá para prever quando isso ocorrerá. "Dependerá da resposta das organizações envolvidas."
De acordo com Reis, em regiões onde as populações ainda não tiveram contato com a doença existe muita resistência ao atendimento médico e muita superstição em relação ao vírus. Ele defendeu urgência no aporte de recursos internacionais para que o índice de mortalidade do vírus não continue crescendo.
Médicos sem Fronteiras denuncia falta de apoio internacional
"Somos sem fronteiras, mas não sem limites”, desabafou nesta quinta-feira (21) a diretora-geral do Médicos sem Fronteiras (MSF) no Brasil, Susana de Deus, ao falar da falta de apoio que a organização tem enfrentado no combate à epidemia do ebola na África Ocidental. “As respostas [de organizações e países] não coincidem com as declarações. Precisamos que os esforços sejam mais vigorosos e mais rápidos”, declarou.
Em coletiva de imprensa nesta manhã, na sede da organização no Brasil, na capital fluminense, Susana informou que a MSF gastou mais de 16 milhões de euros entre dezembro e março somente com missões de combate ao ebola. Mais de mil profissionais foram alocados nas regiões mais críticas e disponibilizadas 400 toneladas de equipamentos. Entretanto, o número não é suficiente e o MSF não pode realocar mais profissionais, pois a organização atua em outras crises humanitárias como no Sudão do Sul, no Iraque e na Síria.
"Muita gente está morrendo hoje, o que seria evitável se houvessem os recursos no terreno. Não compreendemos tanta lentidão”, lamentou. “É preciso multiplicar, multiplicar e multiplicar com rapidez [equipes e equipamentos] até conter o contágio. Precisamos de gente para pôr a mão na massa”, disse Susana ao ressaltar que Libéria e Serra Leoa devem ser prioridades no envio maciço de recursos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), foram confirmados 1.350 mortos pela doença. Susana disse que faltam equipes de médicos, enfermeiros, laboratoristas, equipes de rastreamento, de educação em saúde comunitária, logística para organizar os fluxos, entre outros recursos. O problema é agravado pelas carências dos próprios países, como sistema de saúde precário, falta de água potável, saneamento básico, entre outros problemas de infraestrutura.
Para a representante da MDS, mais importante do que testar medicamentos que ainda não foram qualificados, é investir no cuidado e na prevenção. “É necessário que haja mais organizações no terreno, sobretudo, especialistas em educação em saúde," comentou ao explicar que a falta de informação sobre o contágio e os sintomas por parte da população é um dos principais vetores da contaminação.
'Quando o paciente sai do isolamento e recebe alta, tem festa, fazemos questão de apertar a mão até para que as outras pessoas veja que ele está bem', afirma Paulo Reis
“Quando o paciente sai do isolamento e recebe alta, tem festa, fazemos questão de apertar a mão até para que as outras pessoas veja que ele está bem", disse Reis. “É muito difícil descrever sentimentos, mas é uma emoção muito forte, colocar isso em palavras já não consigo”, acrescentou o médico, que veio de Serra Leoa há cerca de um mês, depois de tratar de 150 pacientes infectados.
Considerado um dos profissionais mais experientes no tratamento do ebola, Reis cuidou de doentes com o vírus na Guiné na primeira epidemia, em 2012, e considera o atual surto muito mais abrangente. “Nunca houve um número tão grande de pacientes, em uma área tão extensa. A doença está se espalhando e se tornou um problema amplo.”
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Em entrevista nesta tarde, na sede da ONG no Rio, Reis comparou o medo do ebola ao que sente no trânsito do Rio de Janeiro. “Quando temos conhecimento do problema e de todos os mecanismos necessários para proteção, desmistificamos”, disse ele, ao explicar que o protocolo rígido faz com que o médico não tenha contato físico com o paciente infectado.- Febre hemorrágica de 'origem indeterminada' causa 13 mortes na RDCongo
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Ele lembrou que, para entrar em um centro de tratamento de ebola, é preciso vestir uma roupa de proteção impermeável, que cobre o corpo e o rosto. O calor provocado pelo uniforme é tanto que torna-se impossível atender o paciente por mais de 40 minutos: “dentro da roupa é sempre muito quente e, se houver sol, rapidamente chega-se à exaustão. Às vezes, a condensação embaça os óculos por dentro e, às vezes, é preciso sair, pois não se enxerga nada.”
O trabalho é intenso: na última missão, eram atendidos, em média, 15 pacientes infectados por dia, em jornadas de cerca de 12 horas. Em toda Serra Leoa, há apenas um centro de tratamento, o do MSF, porque o do governo foi fechado depois que funcionários foram infectados, lembrou Paulo Reis.
Para ele, mesmo que houvesse um caso importado de ebola no Brasil, o impacto seria pequeno e a doença seria rapidamente contida. “Os hábitos culturais naqueles países contribuem para o contágio. É o caso dos rituais de enterro, em que se tem muito contato com a pessoa que morreu.” Reis citou também o hábito de comer morcego e macaco, potenciais transmissores do ebola, entre os que facilitam a contaminação. Se o surto é um perigo remoto no Brasil, nos países africanos atingidos pela doença, a situação é alarmante, alertou. Antigamente, disse Reis, os surtos eram controlados em dois três meses, mas agora não dá para prever quando isso ocorrerá. "Dependerá da resposta das organizações envolvidas."
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Médicos sem Fronteiras denuncia falta de apoio internacional
"Somos sem fronteiras, mas não sem limites”, desabafou nesta quinta-feira (21) a diretora-geral do Médicos sem Fronteiras (MSF) no Brasil, Susana de Deus, ao falar da falta de apoio que a organização tem enfrentado no combate à epidemia do ebola na África Ocidental. “As respostas [de organizações e países] não coincidem com as declarações. Precisamos que os esforços sejam mais vigorosos e mais rápidos”, declarou.
Em coletiva de imprensa nesta manhã, na sede da organização no Brasil, na capital fluminense, Susana informou que a MSF gastou mais de 16 milhões de euros entre dezembro e março somente com missões de combate ao ebola. Mais de mil profissionais foram alocados nas regiões mais críticas e disponibilizadas 400 toneladas de equipamentos. Entretanto, o número não é suficiente e o MSF não pode realocar mais profissionais, pois a organização atua em outras crises humanitárias como no Sudão do Sul, no Iraque e na Síria.
"Muita gente está morrendo hoje, o que seria evitável se houvessem os recursos no terreno. Não compreendemos tanta lentidão”, lamentou. “É preciso multiplicar, multiplicar e multiplicar com rapidez [equipes e equipamentos] até conter o contágio. Precisamos de gente para pôr a mão na massa”, disse Susana ao ressaltar que Libéria e Serra Leoa devem ser prioridades no envio maciço de recursos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), foram confirmados 1.350 mortos pela doença. Susana disse que faltam equipes de médicos, enfermeiros, laboratoristas, equipes de rastreamento, de educação em saúde comunitária, logística para organizar os fluxos, entre outros recursos. O problema é agravado pelas carências dos próprios países, como sistema de saúde precário, falta de água potável, saneamento básico, entre outros problemas de infraestrutura.
Para a representante da MDS, mais importante do que testar medicamentos que ainda não foram qualificados, é investir no cuidado e na prevenção. “É necessário que haja mais organizações no terreno, sobretudo, especialistas em educação em saúde," comentou ao explicar que a falta de informação sobre o contágio e os sintomas por parte da população é um dos principais vetores da contaminação.