Mães de BH posam para ensaio fotográfico que chama atenção para o preconceito com a amamentação em público
Dados recentes do Ministério da Saúde mostram que 61% das crianças brasileiras não mamam exclusivamente no peito até os seis meses, como é recomendado pela OMS
Valéria Mendes - Saúde Plena
Publicação:14/03/2016 12:42Atualização: 14/03/2016 14:06
Sem pedir licença, oito mães e seus bebês se sentaram, uma ao lado da outra, nos bancos de uma famosa pastelaria no Bairro de Lourdes, em Belo Horizonte, para um ensaio sobre amamentação em público. Enquanto eram clicadas por Alexandre Périgo - fotógrafo que ficou conhecido pelo registro da esposa grávida de lingerie pelas ruas da capital -, funcionários da loja conversavam baixo sobre a cena que se desenrolava diante de seus olhos em uma tarde nublada e chuvosa de sábado (12/03). Um deles era Ângelo Bahia, 23 anos. Ex-gerente de banco e atualmente freelancer na loja de pastéis, ele se recordou dos tempos de bancário: “Eu não sei o que acho sobre amamentação em público. Só sei que quando eu trabalhava em banco e uma mulher com neném se sentava na minha frente e começava a amamentar, eu ficava constrangido. A gente fica sem saber o que fazer. Lembro de ficar desviando o olhar com medo de aquelas mulheres pensarem que eu podia estar olhando para o peito delas”.
O corpo da mulher (do homem ou da criança) é o arcabouço da nossa existência, o que nos permite estar no mundo como pessoa. Nem tudo é sobre sexo. A amamentação em público surge de uma demanda por alimento de uma criança que tem direito ao que é considerado o alimento mais completo para o seu desenvolvimento: o leite materno. E criança é prioridade absoluta como diz o artigo 227 da Constituição Federal: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A lei nº 1510/2015 que protege o direito das crianças ao leite materno já foi aprovada em primeiro turno pela Câmara de BH. De autoria do vereador Gilson Reis (PCdoB), prevê multa para estabelecimento - e inclui bem público - que constranger o ato da amamentação em suas instalações. Quem descumprir a norma está sujeito a multa de R$ 500 e, em caso de reincidência, o valor é R$ 1000,00.
Pesquisa de 2015 mostra que a maioria das brasileiras (55%) acha perfeitamente natural amamentar em público; 22% considera inevitável, 21% constrangedor e apenas 2% acha errado. O estudo conduzido pela Lansinoh foi realizado com 13.169 mães e gestantes em nove países no primeiro semestre de 2014 e. No Brasil, foram entrevistadas 2 mil pessoas.
Cecília Reis Aquino, 25 anos, é mãe de Enrico, de 7 meses, e participou do ensaio conduzido por Alexandre Périgo. O garotinho mamou exclusivamente até os 4 meses de vida. Com o fim da licença-maternidade e o retorno ao trabalho, a mãe teve que introduzir as papinhas de fruta e de legumes para suprir a fome do filho. “Eu fiquei apaixonada por mim mesma com a amamentação. Saber que um alimento produzido pelo meu corpo estava alimentando, nutrindo, engordando o meu filho e ajudando no desenvolvimento dele me fez ter certeza de como o corpo feminino é mesmo poderoso”, afirma Cecília.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS) recomendam que até os seis meses os bebês só se alimentem de leite materno, não precisa sequer de água. No entanto, a falta de apoio e investimento na saúde das novas gerações ainda não é uma causa abraçada por todos os setores da sociedade. Na iniciativa privada, só tem direito à licença-maternidade de 6 meses as mulheres que trabalham em instituições que aderiram ao programa do governo federal intitulado ‘Empresa Cidadã’.
A mãe de Enrico diz que quis participar do projeto porque considera o tema importante. “Amamentar é alimentar. Não é nada mais que isso”, declara.
Thayne Lima, 26 anos, é mãe de Valentina, 1 ano, e de Sofia, 3 anos. A mais velha largou o peito 15 dias antes de a irmã chegar à família. Thaine ressalta o quanto que a amamentação de crianças consideradas “mais velhas” é ainda um tabu maior. “Eu grávida, amamentando a Sofia, tive o desprazer de ouvir de uma pessoa que sequer conhecia que minha filha estava grande demais para mamar”, diz.
Mesmo diante de vários estudos que atestam os benefícios do leite materno até os 2 anos (ou mais) para meninos e meninas, a taxa de adesão ao aleitamento ainda é pequena no país. Dados divulgados recentemente pelo Ministério da Saúde revelam que 61% das crianças brasileiras não são amamentadas exclusivamente até o sexto mês.
O leite materno contém todos os nutrientes essenciais para o crescimento e o desenvolvimento das crianças. Além disso, reduz a mortalidade infantil, diminuiu os riscos de alergia, evita infecção respiratória, diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes, reduz a chance de obesidade, tem efeito positivo na inteligência, promove o vínculo afetivo entre mãe e filho.
Por tudo isso, constranger uma mãe que nutre seu filho é contribuir para o desmame precoce já que a amamentação não é um mar de rosas e exige uma dedicação intensa da mulher. “O objetivo desse ensaio é atacar a sexualização, o preconceito, o conservadorismo e o machismo que envolvem a amamentação em público”, afirma Périgo.
A cantora e atriz Paola Alves é esposa de Alexandre Périgo e foi quem protagonizou o ensaio de lingerie. Além de participar da concepção do novo trabalho junto com o marido, foi uma das mulheres fotografadas no ensaio sobre amamentação em público. Leonardo, 10 meses, mama em livre demanda e sua mãe espera que as fotos estimulem o diálogo e minem o preconceito.
Paola e Alexandre preparam agora um terceiro projeto que vai discutir identidade de gênero. “Vou vestir o Leo de bailarina e quero fotografar crianças com brinquedos invertidos”, planeja Périgo.
Mães posam para ensaio sobre amamentação em público no Bairro Lourdes, em BH
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Assim como Ângelo Bahia, é bom para a saúde das novas gerações e também das próprias mulheres, já que a amamentação é fator protetor contra o câncer de mama, que as pessoas aprendam a lidar com a situação. E é simples. Diante de uma mãe que alimenta seu filho ou sua filha, não faça nada, siga a sua vida ou continue o que estava fazendo. O desafio para superar esse tal “constrangimento” está intrinsecamente relacionado a objetificação do corpo feminino, que é sustentada e naturalizada na cultura machista. No entanto, é possível mudar. -
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O corpo da mulher (do homem ou da criança) é o arcabouço da nossa existência, o que nos permite estar no mundo como pessoa. Nem tudo é sobre sexo. A amamentação em público surge de uma demanda por alimento de uma criança que tem direito ao que é considerado o alimento mais completo para o seu desenvolvimento: o leite materno. E criança é prioridade absoluta como diz o artigo 227 da Constituição Federal: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A lei nº 1510/2015 que protege o direito das crianças ao leite materno já foi aprovada em primeiro turno pela Câmara de BH. De autoria do vereador Gilson Reis (PCdoB), prevê multa para estabelecimento - e inclui bem público - que constranger o ato da amamentação em suas instalações. Quem descumprir a norma está sujeito a multa de R$ 500 e, em caso de reincidência, o valor é R$ 1000,00.
Pesquisa de 2015 mostra que a maioria das brasileiras (55%) acha perfeitamente natural amamentar em público; 22% considera inevitável, 21% constrangedor e apenas 2% acha errado. O estudo conduzido pela Lansinoh foi realizado com 13.169 mães e gestantes em nove países no primeiro semestre de 2014 e. No Brasil, foram entrevistadas 2 mil pessoas.
Da direita para a esquerda: Cecília Reis Aquino, Paola Alves e Thayne Lima (penúltima)
Cecília Reis Aquino, 25 anos, é mãe de Enrico, de 7 meses, e participou do ensaio conduzido por Alexandre Périgo. O garotinho mamou exclusivamente até os 4 meses de vida. Com o fim da licença-maternidade e o retorno ao trabalho, a mãe teve que introduzir as papinhas de fruta e de legumes para suprir a fome do filho. “Eu fiquei apaixonada por mim mesma com a amamentação. Saber que um alimento produzido pelo meu corpo estava alimentando, nutrindo, engordando o meu filho e ajudando no desenvolvimento dele me fez ter certeza de como o corpo feminino é mesmo poderoso”, afirma Cecília.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde (MS) recomendam que até os seis meses os bebês só se alimentem de leite materno, não precisa sequer de água. No entanto, a falta de apoio e investimento na saúde das novas gerações ainda não é uma causa abraçada por todos os setores da sociedade. Na iniciativa privada, só tem direito à licença-maternidade de 6 meses as mulheres que trabalham em instituições que aderiram ao programa do governo federal intitulado ‘Empresa Cidadã’.
A mãe de Enrico diz que quis participar do projeto porque considera o tema importante. “Amamentar é alimentar. Não é nada mais que isso”, declara.
Thayne Lima, 26 anos, é mãe de Valentina, 1 ano, e de Sofia, 3 anos. A mais velha largou o peito 15 dias antes de a irmã chegar à família. Thaine ressalta o quanto que a amamentação de crianças consideradas “mais velhas” é ainda um tabu maior. “Eu grávida, amamentando a Sofia, tive o desprazer de ouvir de uma pessoa que sequer conhecia que minha filha estava grande demais para mamar”, diz.
Mesmo diante de vários estudos que atestam os benefícios do leite materno até os 2 anos (ou mais) para meninos e meninas, a taxa de adesão ao aleitamento ainda é pequena no país. Dados divulgados recentemente pelo Ministério da Saúde revelam que 61% das crianças brasileiras não são amamentadas exclusivamente até o sexto mês.
O leite materno contém todos os nutrientes essenciais para o crescimento e o desenvolvimento das crianças. Além disso, reduz a mortalidade infantil, diminuiu os riscos de alergia, evita infecção respiratória, diminui o risco de hipertensão, colesterol alto e diabetes, reduz a chance de obesidade, tem efeito positivo na inteligência, promove o vínculo afetivo entre mãe e filho.
Por tudo isso, constranger uma mãe que nutre seu filho é contribuir para o desmame precoce já que a amamentação não é um mar de rosas e exige uma dedicação intensa da mulher. “O objetivo desse ensaio é atacar a sexualização, o preconceito, o conservadorismo e o machismo que envolvem a amamentação em público”, afirma Périgo.
Paola Alves (segurando o cartaz) espera que o ensaio sobre amamentação em público estimule o diálogo e mine o preconceito
A cantora e atriz Paola Alves é esposa de Alexandre Périgo e foi quem protagonizou o ensaio de lingerie. Além de participar da concepção do novo trabalho junto com o marido, foi uma das mulheres fotografadas no ensaio sobre amamentação em público. Leonardo, 10 meses, mama em livre demanda e sua mãe espera que as fotos estimulem o diálogo e minem o preconceito.
Paola e Alexandre preparam agora um terceiro projeto que vai discutir identidade de gênero. “Vou vestir o Leo de bailarina e quero fotografar crianças com brinquedos invertidos”, planeja Périgo.
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