Cego há 16 anos, Flávio Luís começou a fazer esculturas em 2005. "Antes do acidente de carro, nunca havia tido contato com a arte. Depois que perdi a visão, Deus me deu o dom de criar peças por meio da argila. Agora, posso ensinar a técnica a outras pessoas", destaca. Foi com esse dom que o artista plástico deixou dezenas de crianças, jovens, adultos e idosos admirados na manhã de ontem. Flávio esteve no Centro Olímpico de Samambaia e segue até sexta-feira por outras três unidades no Distrito Federal. Ele ministra o curso de Criatividade e modelagem em argila, que faz parte da programação do Encontro do Esporte Paralímpico 2014.
O evento é promovido pelo projeto Esporte e Cidadania nos centros olímpicos de Ceilândia, Riacho Fundo I, Samambaia e São Sebastião, em parceria da Fundação Assis Chateaubriand e da Secretaria de Esporte do Distrito Federal. Todos ouviam atentos às orientações de Flávio e, pouco a pouco, iam dando forma a esculturas de rostos. Cada um do seu jeito, seguindo suas perspectivas. Uns com mais habilidade, outros com menos. Mas os rostos iam aparecendo. O resultado rendeu boas risadas e um quê de orgulho por despertar um talento que não era conhecido.
Para a aluna de natação Bianca Neves da Silva, 14 anos, o curso foi um desafio. "Eu gosto muito de criar coisas, mas foi bem difícil na hora de fazer o formato do rosto, os olhos, a boca e o nariz", ponderou a garota, que, apesar das dificuldades, saiu satisfeita. Bem-humorado, o aluno de atividade física orientada Raimundo Gomes da Silva, 60 anos, juntou-se a outros idosos e fez a escultura em homenagem à professora. Moldou cada parte do rosto com todo capricho. "Esse curso foi a coisa mais linda que vi neste Centro Olímpico, foi gostoso demais", disse ele, que trabalha como borracheiro. "A gente, enxergando, faz as coisas de forma errada, e o instrutor, sem enxergar, faz tudo direitinho. Achei uma maravilha." A colega Antônia Lima de Sousa, 68 anos, já pensa em levar adiante o que aprendeu. "Nunca tinha feito um artesanato assim. Tudo o que vem para a gente nessa idade é muito bom, continuamos aprendendo cada dia mais. Agora, posso pegar mais prática e fazer outras peças", comentou, com um belo sorriso.
Experiência tátil Além do curso, o Encontro do Esporte Paralímpico proporciona aos participantes, nesta primeira semana, uma experiência tátil e diferenciada. Com os olhos vendados, as turmas puderam contemplar esculturas produzidas por artistas que têm a visão prejudicada. Tocaram uma a uma e eram desafiados a identificá-las. Outra vivência foi guiar uma pessoa com deficiência visual em situações do dia a dia. Os alunos se dividiram em duplas. Um fazia o papel do guia e o outro tinha uma venda nos olhos. Eles eram orientados a dar o apoio necessário, deixar a pessoa segurar no braço, passar por uma porta, sentar-se em uma cadeira, subir e descer escadas.
Os amigos Mateus Ribeiro, 11 anos, e Rafael Paulino, 12, sentiram dificuldade no início, mas conseguiram lidar bem com a novidade. "É difícil não ver nada e ter que confiar nele para andar nos lugares, mas o Rafael me guiou bem, sem deixar eu tropeçar ou bater em nada. Com os olhos vendados, você nem percebe se tem alguém na sua frente, mas, com um pouco de prática, vai pegando o jeito e fica fácil como andar de bicicleta", observou o menino. Hoje, o curso e as atividades que envolvem pessoas com deficiência visual serão realizados no Centro Olímpico de Ceilândia. Amanhã e na sexta, quem aproveita a oportunidade são os alunos de Riacho Fundo I e Samambaia, respectivamente.