Novas regras da ANS nem sempre garantem autonomia da gestante em partos com plantonistas
Nas principais maternidades de BH, a presença das doulas, apesar de ser permitida pelos hospitais, passa pela autorização do médico de plantão, o que frustra pacientes de plano de saúde que sonham com um parto humanizado e não podem arcar com uma equipe particular
As novas regras da Agência Nacional de Saúde para os partos na rede privada entraram em vigor no dia 7 de julho e encheram de esperança gestantes que, diante das altas taxas de cesárea dos médicos, sonhavam com um parto normal onde elas pudessem ser protagonistas e ter suas vontades atendidas. Agora, para os obstetras realizarem cesáreas eletivas, precisam informar a paciente sobre todos os procedimentos, implicações e consequências para a mulher/bebê e, caso elas ainda desejem o procedimento cirúrgico, devem assinar um termo de consentimento. Essa iniciativa busca diminuir consideravelmente o número de cesáreas eletivas e ainda incentivar os obstetras a acompanhar o parto fisiológico com segurança e acolhimento individualizado, segundo as diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS). Entretanto, isso não é garantia de que a mulher que optar por ter o bebê com um plantonista terá todos os seus direitos assegurados.
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"A gestante pode fazer um plano de parto, documento com diretrizes para a hora do nascimento e levar junto com seus documentos de pré natal. Assim sendo, apresentá-lo para o plantonista, visto que durante a gestação informou-se sobre as boas práticas, baseadas em evidências científicas, segundo OMS e, sabe que é direito dela ser informada sobre os procedimentos que serão feitos no atendimento a ela/ao bebê. As maternidades podem oferecer uma ambiência com pouca luz, filmar ou fotografar o parto (pelo acompanhante de livre escolha), levar música, caminhar, ingerir líquidos, ter acesso as boas práticas (bola de pilates, chuveiro, etc), pedir ou recusar analgesia, escolher a posição para ter seu bebê, se recusar a episiotomia e kristeller, etc. Poder ter ainda garantida a participação de uma doula, escolhida por ela, integrando a equipe médica durante o trabalho de parto,parto e pós parto imediato, mas isso nem sempre é respeitado pela equipe de plantão", explica Isabel Cristina, da ONG Bem Nascer.
Apesar das principais maternidades particulares de Belo Horizonte garantirem que orientam seus profissionais a permitirem a entrada das doulas (mulheres que trabalham o emocional das mães durante o parto e proporcionam além de um clima mais calmo maior conforto físico e emocional às parturientes por meio de conversas, massagens e técnicas de respiração) com as gestantes e acompanhantes e a seguir o plano de parto feito pela mulher, as mesmas ainda têm dificuldade de participar de todo processo - pré parto, parto, sala de parto (bloco cirúrgico) e pós parto imediato.
"Atuo como doula desde 2008 e, até hoje, acompanhei somente uma gestante com plantonista. Nossa atuação depende da autorização dos plantonistas/maternidades. Doula não substitui acompanhante de livre escolha da mulher, precisa ser vista como parte da equipe. Nosso trabalho é feito para somar, não para vigiar ninguém. Nosso foco é no bem estar da mãe/bebê/família, buscando uma melhor ambiência para que ela se sinta segurança, confortável, no local de sua escolha. Desde massagens para aliviar a dor, palavras de incentivo e conforto, entre outras práticas visando seu bem estar. Acreditamos e nos empenhamos para ampliar o trabalho multidisciplinar, mas infelizmente ainda encontramos muita resistência, por muitos ainda desconhecerem nosso papel no cenário da parturição. Lembrando ainda que doula não faz nenhum procedimento técnico", explica Isabel.
A reportagem entrou em contato com o Vila da Serra, Mater dei, Unimed BH, Santa Fé e Octaviano Neves. A Octaviano Neves declarou que não permite a entrada das doulas e a Santa Fé e o Mater Dei não deram retorno até o fechamento da matéria. . O Vila da Serra também declarou permitir a entrada da doula e o fornecimento de materiais, mas informou que o plantonista tem automonia para aceitar ou não o trabalho em conjunto. Já a Unimed informou que as gestantes podem ser acompanhadas por até três pessoas, além da doula, e que são oferecidos diversos equipamentos para o acompanhamento do parto, como bola de Bobath, escada de Ling e banheira
Diante desse cenário, que é desanimador para gestantes que buscam um parto humanizado e que não podem arcar com os custos de uma equipe particular, e não pretendem ter o bebê pelo SUS, a solução está na busca de informações e na troca de experiência. Com conhecimento, a mulher pode tomar as decisões que julgar melhores e mais condizentes com o seu desejo para o momento do parto. Em Belo Horizonte, ocorrem, duas vezes por mês, as rodas da ONG Bem Nascer. Nesse encontro as gestantes e seus parceiros trocam informações sobre concepção, gestação, parto, pós-parto, amamentação, profissionais, instituições, palestras, preparação para o parto. "O encontro é gratuito e aberto a toda as pessoas que queiram participar e saberem mais sobre o universo gravídico", conclui Isabel.
A funcionária pública Pamela Soares, de 32 anos, teve uma experiência negativa com plantonista quando ganhou o bebê Gabriel, que nasceu no dia 10 de julho desse ano. Além de não ter permitida a entrada da doula, ela sofreu uma série de intervenções. "Não respeitaram o meu plano de parto, fui obrigada a ficar o tempo todo com a luz acessa e em jejum total. O obstetra falava o tempo todo que o bebê era muito grande e eu não conseguiria parir, me obrigou a permanecer na posição ginecológica e me deu anestesia ao invés de oferecer métodos não farmacológicos. Além disso, fez episiotomia mesmo eu pedindo para que não fizesse. Os pontos ainda não cicatrizaram, sinto muita dor e a recuperação tem sido difícil", conta a mulher, que pretende engravidar novamente. "Da próxima vez, vou me organizar para arcar com os custos de uma equipe humanizada ou então vou ter meu filho no SUS, mas não arrisco parir com plantonista nunca mais", garante.
Em tempo
Agora, as gestantes podem descobrir, previamente, qual a taxa de realização de cesáreas de seu obstetra, já que as novas regras preveem também que os planos de saúde repassem essa informação em um prazo de até 15 dias, e, além disso, caso não queriam assinar o termo de consentimento para a cirurgia eletiva, o procedimento só poderá ser feito caso seja comprovada sua necessidade pelo partograma (documento que será requisitado pelo plano de saúde para o pagamento do médico e que registra, por exemplo, a frequência das contrações uterinas, os batimentos cardíacos fetais e a dilatação da gestante).
No Brasil, dos mais de 2,9 milhões de partos, cerca de 55,6% são feitos por via cirúrgica, sendo que a recomendação da Organização Mundial de Saúde é de 15%. Na rede privada, o número é ainda maior, 84,6%.
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