ESPORTE E CIDADANIA | ENTREVISTA

Velocista Ariosvaldo Fernandes fala sobre atletismo em cadeira de rodas

Às vésperas dos Jogos Parapan-americanos, um dos atletas mais velozes das Américas fala sobre o dia a dia com o esporte em Ceilândia


Camila de Magalhães -

Publicação: 30/07/2015 20:10 | Atualização: 31/07/2015 00:49

 (Camila de Magalhães/FAC/D.A Press)
Morador de Ceilândia Norte, Ariosvaldo Fernandes da Silva tem 38 anos. Conhecido como Parré, vem construindo uma história marcante no esporte paraolímpico do Brasil, com o atletismo em cadeira de rodas. Ele é oito vezes campeão brasileiro, recordista brasileiro nas provas de 100m, 200m e 400m, bicampeão pan-americano nos 100m e 200m. Nas Paralimpíadas de Londres, ficou em quarto lugar nos 100m. E no Mundial da França em 2011, conquistou medalha de bronze, também nos 100m.

A reviravolta na vida de Parré começou aos 16 anos, quando ainda morava em Planaltina-DF. Até então, era um jovem sedentário, que só ia de casa para a escola e vice-versa. A paralisia nos membros inferiores, causada pela poliomielite que contraiu quando era bebê, era encarada na infância e início da adolescência pelos professores de educação física como um impedimento para a prática de esportes. Foi aí que um professor o apresentou ao basquete em cadeira de rodas. Ariosvaldo gostou da ideia e começou a praticar. Mais tarde, com o fim do time, encarou o atletismo em cadeira e rodas e não largou mais.

Hoje ele é a maior referência do país como velocista na modalidade. Há dois anos, treina com firmeza no Centro Olímpico e Paralímpico de Ceilândia (Parque da Vaquejada), gerido pela Fundação Assis Chateaubriand (FAC) e Secretaria do Esporte e Lazer do Distrito Federal. Lá, conta com o apoio do técnico do Centro de Treinamento em Educação Física Especial (Cetefe) Dênis Gigante e do auxiliar técnico e integrante da equipe pedagógica da FAC, Heeyhashy da Silva.

Para saber mais sobre essa história, confira a entrevista concedida por Parré à Fundação dias antes de embarcar para os Jogos Parapan-americanos, que serão realizados em agosto no Canadá.

Como foi a transição do basquete para o atletismo em cadeira de rodas?

Joguei basquete em cadeira de rodas por cerca de sete anos. Como o clube que eu jogava em Planaltina acabou com o time, por não investir mais em rendimento, fiquei sem chão. Então o técnico me chamou para atletismo, comecei a treinar e participar de campeonatos. O primeiro foi o regional. Consegui ficar em terceiro lugar e o professor percebeu que eu tinha condições de chegar além e começou a investir em mim. Três anos depois, consegui ser campeão brasileiro na minha categoria.

 

A gente passou a treinar para tentar o Parapan-americano. Foquei por dois anos para o Parapan 2007. E veio o resultado: fui campeão nos 100m e 400m e consegui a prata nos 200m. Com os títulos, decidimos tentar as Paralimpíadas. Consegui ir para Londres em 2008, cheguei à final nos 100m e fiquei em oitavo lugar. Meu treinador disse que, com mais trabalho, conseguiria chegar mais à frente. Treinei mais e fui bicampeão pan-americano e quebrei o recorde nos 100m e 200m em Guadalajara 2011. Agora estou chegando ao meu terceiro Parapan e vou tentar ser tricampeão.

Quais foram as maiores dificuldades que enfrentou?

Quando comecei a levar mais a sério o esporte, no Rio 2007, eu tinha dificuldade de locomoção e estava quase sem nenhum apoio financeiro. Até dois anos atrás, trabalhava em uma oficina de manutenção e fabricação de cadeira de rodas em Ceilândia. Hoje me dedico exclusivamente ao esporte. Tenho as bolsas do governo federal que me ajudam bastante e consigo custear minha vida, morar mais perto do treino. Passei a receber a Bolsa Pódio por conta de ser campeão pan-americano e medalha de bronze no último Mundial. Mas há atletas que sofrem muito, pois não estão nesse nível. Na base, o apoio costuma ser difícil. No início, eu não tinha um material legal. Hoje, se você não tiver 4 mil dólares, não consegue comprar esse tipo de cadeira com que eu treino.

 

Qual é a importância do Centro Olímpico e Paralímpico nos seus treinos?

Heeyhashy, Parré e Dênis Gigante (Camila de Magalhães/FAC/D.A Press)
Heeyhashy, Parré e Dênis Gigante

 

Tenho um apoio muito bom da equipe, tanto do Dênis Gigante do Cetefe quanto do professor Heeyhashy da Fundação Assis Chateaubriand. Graças a Deus, temos uma pista boa em Ceilândia, oferecida pela Secretaria do Esporte e Lazer do DF. Muitos estados não têm uma pista como essa. Todos os meus títulos mais recentes saíram lá de dentro. Recebo tudo o que preciso, os técnicos conseguem adaptar o trabalho para mim. É muito bacana. 

 

Como se sente em ser reconhecido pelo seu esforço?

É muito legal esse reconhecimento. Meus amigos, o pessoal do comércio, os colegas do Centro Olímpico e Paralímpico e várias outras pessoas me dão força e ficam na torcida. Tento lutar para dar esse orgulho para o pessoal da cidade, isso me motiva a fazer o melhor. O pessoal faz a maior festa, estão na expectativa para o Parapan.

Que mensagem sobre o esporte você deixa a outras pessoas com deficiência?

Aconselho a ter muita vontade para praticar esportes paralímpicos. É uma porta muito boa, com opções de várias modalidades. Sugiro procurar um clube e se encaixar numa modalidade. Comecei no basquete e hoje tenho uma carreira bacana no atletismo em cadeira de rodas. Tudo o que tenho hoje foi o esporte que me deu.

 

Não devemos parar de pensar que somos uns coitados por estarmos em cadeira de rodas. É muito melhor procurar um esporte e tentar fazer. Como deu certo para mim, pode dar para outras pessoas. Mas tem que lutar, ser guerreiro. Quando você consegue ser bem sucedido, é reconhecido pelo esporte que faz. Hoje sou reconhecido por ser um velocista, por me destacar no esporte e não, por ser uma pessoa com deficiência.

 

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